MARKETA
LAZAROVÁ (FRANTISEK VLACIL, TCHECOSLOVAQUIA, 1967).
(“UM ÉPICO MEDIEVAL TCHECO, BELO, HERMÉTICO E REFLEXIVO”):
(CRÍTICA
POR RAFAEL VESPASIANO).
“Durante a Idade Média,
na região da Boêmia, dois clãs rivais, os Kozílk e Lazar, além de rivais, sua
disputa levam o espectador à uma reflexão: pois, o primeiro clã é pagão e o
segundo, cristão, Lazar, inclusive, prometeu sua filha ao convento, a Marketa
do título. O filme mostra todos os aspectos de “trevas”, obscuridade
intelectual e cultural de boa parte dos anos medievais. O conflito religioso é
apenas uma das camadas do filme. Belamente fotografado em preto-e-branco o que
ressalta a ruína, degradação, “sujeira” cultural e religiosa dos envolvidos, da
sociedade à época.
O filme dividido em
duas partes é marcado por uma primeira parte que se passa num duro inverno,
brilhantemente captado pela fotografia e pela câmera do diretor de fotografia,
sempre num ambiente gélido, frio, áspero para a sobrevivência humana e sempre
marcado pela neve em todos os espaços onde as tramas se passam.
Os irmãos Kozílk, a
mando do pai, vivem de furtos, assassinatos, sequestros e roubos, à beira das
trilhas, atacam uma caravana de dois nobres que são raptados por eles e levados
para o cativeiro na casa do Kozílk. O rei imediatamente manda uma expedição,
liderada por um capitão, para regatar os nobres, a pedido do pai destes. A
barbárie passa a ser retratada mais asperamente ainda (e friamente); enquanto
isso Lazar é poupado pelos Kozílk de ser morto, pois pede para continuar vivo
para proteger sua filha, Marketa.
Fato que revolta o
chefe do clã rival; enquanto isso Lazar leva a filha para o convento, mas como
se recusa a lutar lado-a-lado com a família rival, por uma causa em comum: a
guerra contra o rei, que enviou a expedição para resgatar os dois nobres
raptados pelos Kozílk. O chefe deste clã manda seu filho, Mikolás, destruir a
fortaleza de Lazar, aquele acaba se vingando e rapta a filha de Lazar e a
estupra. Mas o amor começa a surgir entre os dois, de maneira inesperada,
passional e bruscamente, e, lógico, o amor entre eles é proibido e interdito
pelas famílias rivais. Mas o relacionamento amoroso insólito e brusco é levado à
frente de maneira violenta, mas belamente filmada, com uma excelente trilha
sonora e captação de ruídos do som direto da natureza sempre presente e hostil
aos seres humanos no enredo do filme.
Chega o momento do
confronto entre o exército do rei e os Kozílk, uma batalha dura, violenta, fria
se trava e o futuro do casal é trágico, lembrando histórias conhecidas
(interdiscurso/intertextualidade), como “Tristão e Isolda”, “Romeu e Julieta”,
para ficar nos mais óbvios.
O filme é belíssimo,
uma experiência única para o espectador, o filme hermético, mas vale a pena
assisti-lo pela reflexão que somos obrigados a fazer em relação a longa era
obscura do medievalismo e, sobretudo, das questões religiosas (em guerra, para
variar) e, também, das questões de sobrevivência humana e existencialismo
humano, em meio a um ambiente hostil, de ambiência nefasta para as pessoas e de
terror, guerras e violência constantes. A questão do homem na natureza é
brilhantemente trabalhada, mas, principalmente, a questão do homem com os seus semelhantes,
parentes ou não, com deus ou não, mas, especialmente consigo mesmo.
O filme é considerado o
mais belo das películas tchecas, esteticamente e em termos de enredo, até hoje.
Um clássico em absoluto que não se restringe ao medievalismo mas a condição
humana no mundo em todos os tempos.”
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