quinta-feira, 28 de maio de 2015

MARKETA LAZAROVÁ (FRANTISEK VLACIL, TCHECOSLOVAQUIA, 1967).

(“UM  ÉPICO MEDIEVAL TCHECO, BELO, HERMÉTICO E REFLEXIVO”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO).



“Durante a Idade Média, na região da Boêmia, dois clãs rivais, os Kozílk e Lazar, além de rivais, sua disputa levam o espectador à uma reflexão: pois, o primeiro clã é pagão e o segundo, cristão, Lazar, inclusive, prometeu sua filha ao convento, a Marketa do título. O filme mostra todos os aspectos de “trevas”, obscuridade intelectual e cultural de boa parte dos anos medievais. O conflito religioso é apenas uma das camadas do filme. Belamente fotografado em preto-e-branco o que ressalta a ruína, degradação, “sujeira” cultural e religiosa dos envolvidos, da sociedade à época.
O filme dividido em duas partes é marcado por uma primeira parte que se passa num duro inverno, brilhantemente captado pela fotografia e pela câmera do diretor de fotografia, sempre num ambiente gélido, frio, áspero para a sobrevivência humana e sempre marcado pela neve em todos os espaços onde as tramas se passam.
Os irmãos Kozílk, a mando do pai, vivem de furtos, assassinatos, sequestros e roubos, à beira das trilhas, atacam uma caravana de dois nobres que são raptados por eles e levados para o cativeiro na casa do Kozílk. O rei imediatamente manda uma expedição, liderada por um capitão, para regatar os nobres, a pedido do pai destes. A barbárie passa a ser retratada mais asperamente ainda (e friamente); enquanto isso Lazar é poupado pelos Kozílk de ser morto, pois pede para continuar vivo para proteger sua filha, Marketa.
Fato que revolta o chefe do clã rival; enquanto isso Lazar leva a filha para o convento, mas como se recusa a lutar lado-a-lado com a família rival, por uma causa em comum: a guerra contra o rei, que enviou a expedição para resgatar os dois nobres raptados pelos Kozílk. O chefe deste clã manda seu filho, Mikolás, destruir a fortaleza de Lazar, aquele acaba se vingando e rapta a filha de Lazar e a estupra. Mas o amor começa a surgir entre os dois, de maneira inesperada, passional e bruscamente, e, lógico, o amor entre eles é proibido e interdito pelas famílias rivais. Mas o relacionamento amoroso insólito e brusco é levado à frente de maneira violenta, mas belamente filmada, com uma excelente trilha sonora e captação de ruídos do som direto da natureza sempre presente e hostil aos seres humanos no enredo do filme.
Chega o momento do confronto entre o exército do rei e os Kozílk, uma batalha dura, violenta, fria se trava e o futuro do casal é trágico, lembrando histórias conhecidas (interdiscurso/intertextualidade), como “Tristão e Isolda”, “Romeu e Julieta”, para ficar nos mais óbvios.
O filme é belíssimo, uma experiência única para o espectador, o filme hermético, mas vale a pena assisti-lo pela reflexão que somos obrigados a fazer em relação a longa era obscura do medievalismo e, sobretudo, das questões religiosas (em guerra, para variar) e, também, das questões de sobrevivência humana e existencialismo humano, em meio a um ambiente hostil, de ambiência nefasta para as pessoas e de terror, guerras e violência constantes. A questão do homem na natureza é brilhantemente trabalhada, mas, principalmente, a  questão do homem com os seus semelhantes, parentes ou não, com deus ou não, mas, especialmente consigo mesmo.

O filme é considerado o mais belo das películas tchecas, esteticamente e em termos de enredo, até hoje. Um clássico em absoluto que não se restringe ao medievalismo mas a condição humana no mundo em todos os tempos.”

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