quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Gauguin: um pintor de fim do século XIX: pintor moderno. "Primeira Parte: retratos e autorretratos impressionistas e/ou simbolistas".

(Crítica por Rafael Vespasiano)

Parte 1 de 3.

“Gauguin é um pintor do fim do século XIX, que ainda bem, para as Artes, é difícil de ‘encaixá-lo’ numa escola artística, o que prova sua universalidade e modernidade até hoje. Um artista inconformado com seu status burguês francês de Belle Époque, de nascimento, que buscava mais suas origens ancestrais junto a sua origem mestiça -, francesa, espanhola, peruana-incas -, o que forjava uma índole questionadora, de sensível índio, mas não vamos cair nos maniqueísmos positivistas e naturalistas, da crítica artística do século XIX, tal qual Sílvio Romero, no Brasil, ao analisar o escritor ‘mulato/mestiço’, Machado de Assis.
O que que quis dizer como sensível e índio é que essas duas facetas são perceptíveis em seus vários autorretratos e isso não é determinismo psicológico ou do meio ou do momento histórico, mas do hereditário e disso não se foge, no caso dos aspectos físicos indígenas, suas origens não eram de peruanos-incas?!... Quanto à sensível, isso cresceu em sua formação como ser humano e artista inconformado com a classificação dos simbolistas e impressionistas como ‘clássicos’ e ‘superiores’; enquanto, as gravuras orientais japonesas, que admirava; assim como as esculturas e cerâmicas tribais incas-peruanas, ou em geral as artes ancestrais da América Pré-colombiana, de uma maneira geral, tanto estas quantos as obras originais eram classificadas e subclassificadas pela crítica europeia como meramente ‘exóticas’ e/ou de ‘primitivismo artístico’.
Isso mexia com a sensibilidade artística de Gauguin, que as apreciava (e muito, como todas elas fazendo parte das tradições para sua formação e evolução artístico-criadora ao longo dos anos, como veremos). Isso, mexia com sua emotividade que era extremamente passional, mas não por determinismos naturalistas e positivistas de conceitos já ultrapassados de raça, cor, etc. Essa passionalidade era sua, da sua persona, da sua personalidade, assim como a de qualquer um no século XXI, por exemplo. Um de um Van Gogh, também artista plástico do século XIX amigo-inimigo-companheiro de artes-confidente de Gauguin, durante quase toda a vida dois dos artistas, para o bem ou para o mal, em qualquer aspecto para os dois pintores.
Gauguin conheceu Lima, Peru, com a mãe, passando quatro anos na localidade, ainda criança, o que marcou profundamente sua vida e formação futura como artista. A mãe foi afetuosamente lembrada em Escritos de um selvagem, e depois pintada, num quadro de 1890, com traços ‘exóticos improváveis’. (Mazzanti, 2011). Percebam que o diário autobiográfico e teórico escrito pelo próprio Gauguin, possui no título o termo ‘selvagem’, mas não de maneira desrespeitosa, porém valorizando sua ancestralidade. Já o termo ‘exótico’ utilizado pela crítica de artes Anna Mazanti, talvez pelo fato de Gauguin querer ‘exagerar’ os traços físicos maternos com suas ancestrais peruanas, porém numa interpretação forçosa, pois o semblante físico de sua mãe, mesmo com a ancestralidade devidamente registrada, não era tão perceptível, como na interpretação por Gauguin à sua mãe, no retrato desta.
Gauguin sempre foi um peregrino, sua primeira esposa, a dinamarquesa percebeu logo isso, Mette Gad, justificando a conduta não linear do pintor. Sua esposa experimentou a dicotomia do esposo: entre um corretor da bolsa de valores e o pintor; o conflito entre o artista que mudou, junto a outros, a face da pintura e o homem oprimido pela necessidade sustentar a família (tiveram cinco filhos); o eterno cabo de forças entre vocação como artista e a responsabilidade como burguês de família europeia, do século XIX.
  Gauguin optara definitivamente pelas artes, mas foi morar na Dinamarca com Mette e a família. “A mudança foi desastrosa e marcou a separação definitiva do casal. Gauguin passou a manter um diálogo epistolar constante com Mette, marcado pelas mágoas mútuas e questões relacionadas à indiferença e ao egoísmo do pintor.” (MAZZANTI, 2011, p. 12).
O impressionismo da primeira fase de Gauguin, o que foi confirmado por diversos artistas impressionistas também, além de críticos de arte contemporâneos e posteriores, e, artistas simbolistas, escritores em especial, que apreciavam a pintura impressionista que ia ao encontro aos ideais artísticos da Literatura e Poesia Simbolista. O escritor do Simbolismo, Auguste Strindberg, um dos mais importantes do movimento, percebeu que Gauguin se fortalecia na dor, e, tirava proveito do sofrimento para sua arte e suas ideias, e tirava proveito para si do desconforto que acabava gerando nos outros. Como qualquer artista que se preze a Dor é a força motriz maior da Arte, seja literária, ou pictórica, o que motiva os grandes temas e as obras-primas, lógico, temos várias exceções.
O não-pertencimento vivenciado pelo artista que o levou à uma vida errante, o que é perceptível em seus autorretratos, como já afirmado mais acima. Percebe-se tais fatos em retratos e autorretratos, no caso destes últimos, vê-se essa persona dividida e incentivada a uma propensão a uma nômade exaltada nesses autorretratos, como verificamos esteticamente, nos olhares enigmáticos e na escolha da composição e na iconografia (Mazzanti, 2011), exemplos são os: Autorretrato com Cristo amarelo, 1889, e, em Autorretrato com Auréola, 1889.
Dos autorretratos que datam de 1877, ano do seu primeiro autorretrato, àqueles e célebres datados 1888 e 1889, tem-se uma evolução artística natural, que passa de um olhar e estilo incertos e imaturos; Gauguin passa, amadurecido, a uma nova concentração metafórica e pictórica, “que o levou a construir uma máscara. Ela simbolizava o não-pertencimento ao meio burguês europeu e ao mesmo tempo fazia uma referência idólatra e formal ao Japão e à escultura primitiva e selvagem.” (MAZZANTI, 2011, p. 12).
Prefiro trocar os termos ‘primitiva’ e ‘selvagem’ por ‘ancestral’, ‘tribal’ e ‘étnica tradicional’. Vale ressaltar aqui também o famoso autorretrato Os Miseráveis, 1888, no qual Gauguin se ‘pintou’ no papel da personagem protagonista do romance de Victor Hugo, Jean Valjean: “o bandido malvestido de nobreza e doçura interior”, o herói literário revive no autorretrato de Gauguin com “o olhar, flamejante e esquivo, de ¾ em assimetria compositiva, a exemplo das gravuras japonesas, marca na força da máscara abstrata, (como descreveu o amigo Claude-Émile Schuffenecker (...)), a natureza revolucionária do impressionismo. (MAZZANTI, 2011, p. 12-13).
Gauguin confessou que nesse autorretrato se via “bandido numa sociedade que o impediu de renovar o impressionismo e o forçou a um exílio voluntário na Bretanha.” (Ibidem. p. 13). Na Bretanha, em 1888, ao lado de outros jovens pintores, Gauguin começou a formar um programa artístico renovador, que o guiou na concepção de Os Miseráveis, a execução das linhas e das cores, o contorno dos olhos e do nariz, definindo um semblante questionador, desafiante ao espectador e de um home forte, porém sensível, e, maltratado pela sociedade. Numa síntese orgânica de cerâmica pré-colombiana e/ou medieval – tudo organizado sobre um ‘tapete persa’. Neste autorretrato, Gauguin procura sintetizar a imagem do artista moderno/universal: pobres vítimas do sistema social, de quem nos vingamos fazendo o bem, artisticamente.

Autorretrato (Os Miseráveeis). 1888. Óleo sobre tela.
Museu Van Gogh, Amsterdam, Holanda:

   


“O retrato é construído de acordo com uma geometria cerrada, em que o nariz bem perfilado é o ponto de encontro de duas diagonais, a que vem do canto superior direito do quadro e que prossegue até o pescoço. Na parte oposta, que corta a figura ao longo do quadro e o separa em duas zonas bem distintas, descendo ao longo da linha do ombro direito. A cor é arbitrária: azul-verde para os dois retratos, o de Gauguin e o do amigo Bernard, à direita, enquanto o fundo é inteiramente revestido de um amarelo-ouro e decorado com grandes flores brancas.” (PRINCI, 2011, p. 73).


Nos autorretratos sempre aflora a personalidade complexa de Gauguin que assumia que tinha duas facetas: a natureza índia e a sensível. A sensível, segundo o próprio artista, desaparece de forma que a índia possa proceder com firmeza. Discordo em termos das considerações de (MAZZANTI, 2011, p. 13): “A índole índia é o primitivo, aquela que se livra das minúcias da composição e da simples imitação da natureza e reconhece em valor simbólico nas linhas como indicadoras da estrutura primária da realidade. Nas linhas primitivas, a natureza ‘sensível’ é latente.” Quanto às questões pictóricas e de formas artísticas, de pleno acordo, mas discordo quanto ao ‘primitivo’ essencialmente’ selvagem, e o ‘sensível’ primitivo e selvagem não poder se manifestar de maneira direta, porém de forma latente.
Gauguin conviveu na célebre Casa Amarela de Van Gogh, outro artista rebelde e recluso e errante. Os dois trocaram experiências mas brigaram muito, concordavam muito em termos artísticos mas discordavam dos mesmos na mesma proporção. Antes de Gauguin deixar a cidade de Arles, pintou um retrato de Van Gogh, ‘um espelho de si mesmo’, também em ¾, com economia de traços e cores emotivas. Prevalecem os traços primitivos, quase animalescos, no rosto do pintor holandês, como a demonstrar a dificuldade de convivência de ambos -, (Um retrato de certa forma simbolista, com alto poder de sugestão, como pregavam os artistas do Simbolismo, que apreciavam aos dois pintores, apesar de Gauguin e Gogh, não serem filiados ao Impressionismo acadêmico ou ao de Renoir e Monet, dos quais os simbolistas adoravam em especial, os dois impressionistas citados por último, já que tudo que cheirasse a academicismo, os simbolistas também detestavam, por exemplo não viam com bons olhos o trabalho de Manet) -,; O olhar fixo no vazio ‘cansado e saturado’, como o próprio retratado recordou tempos depois, que ele fora retratado por Gauguin por um método contrário a imitar à realidade, pura e simplesmente. (Mazzanti, 2011).

Vicente Van Gogh Pinta Girassóis. 1888. Óleo sobre tela.
Museu Van Gogh, Amsterdam, Holanda:




Entre 1889 e 1890, Gauguin realizou autorretratos religiosos de cunho e tom de agudas crises interiores. Cristo no Jardim das Oliveiras, Autorretrato com cristo Amarelo e a paródia simbólica-diabólica Autorretrato com Auréola. Nesse período, Gauguin rompera com Van Gogh, perdeu o apoio do seu irmão Theo Van Gogh e de Degas, do qual Gauguin admirava o trabalho, e, este, Degas admirava também o trabalho artístico de Gauguin. Porém, Degas não compreendeu a pesquisa linguística simbólico-abstrata de Gauguin, e, este se sentiu de fato um incompreendido, um rebelde, um decadentista típico do Simbolismo, com o qual já flertava.

Cristo no Jardim das Oliveiras. 1889:


O Autorretrato com cristo Amarelo, de 1890, é um Gauguin retratado por si mesmo como um sofredor pela humanidade no Jardim de Getsêmani, emblemático faz a junção coma cerâmica disposta no canto superior direito do quadro, realizando uma comparação entre as fisionomias de Cristo e a que está representada no vaso, é uma figura mais simples, o artista desenhou dois símbolos o Cristo e o Vaso, o Cristo redentor dos pecados da Humanidade, o ‘sensível’, e, o ‘selvagem’, o vaso, mas que podemos encarar, talvez como o Santo Graal? No qual Arimatéia recolheu o sangue de Cristo Crucificado...? Ou mera decoração? Numa manifestação de sua própria entidade (Gauguin), impressionista, contrária às regras de uma civilização que nega a inocência originária e primitiva. As duas leituras se complementam, a minha e a de Mazzanti (2011, p. 13-14)? Fica o questionamento sugestivo da primeira fase de Gauguin: impressionista-simbolista, mas já antropofágica, antecipando as vanguardas artísticas europeias modernas, em muito, originadas apenas nas primeiras décadas do século XX.
Autorretrato com Cristo Amarelo. 1889. Óleo sobre tela.
Coleção dos Herdeiros Denis Saint-Germain-em-Laye, França:

Antropofagia, movimento estético-artístico-literário sempre muito melhor trabalhado qualitativamente pelos latino-americanos e hispano-americanos. Basta citar os dois grandes expoentes do movimento antropofágico universal: Oswald de Andrade e Mário de Andrade, ambos brasileiros, por sinal. Que reconheceram o trabalho antecipador de Gauguin. E, lógico, este já é um antecipador de status artístico reconhecido, ainda em fins do século XIX, na Europa e nos seus exílios voluntários, da antropofagia artística.
Basta vermos as cerâmicas realizadas em 1889, entre as quais a que reproduziu no autorretrato, Gauguin atingiu um repertório vasto e heterogêneo, na direção de uma pintura sempre mais “pura, simplificada, ritmada, decorativa” (F. Cachin, 1988. Apud. MAZZANTI, 2011, p. 14). Desse processo, o exemplo, Vaso Autorretrato em Forma de Cabeça Grotesca, inverno de 1889.

Vaso Autorretrato em Forma de Cabeça Grotesca, inverno de 1889. Porcelana grés esmaltada.
Museu d´Orsay, Paris:

O exemplo extremo de tudo exposto até agora é o autorretrato caricatural com auréola, um concentrado de conteúdos simbólicos em que o pintor explicita mais uma vez a sua persona dividida: na oposição entre auréola/divina e serpente/diabólica, entre pecador e santo; Gauguin construiu uma máscara facial em que a intensidade contrastes das cores colabora para formar um poema de autoestima.

Autorretrato com Auréola. 1889. Óleo sobre madeira.
National Gallery of Art, Washington, EUA:


Longe dos cânones decorativos da máscara facial da gravura japonesa, predominam linhas vetoriais que dão voz combativa e simbólica de força e luta do artista contra o status quo da pintura acadêmica, conservadora de fôrmas e institucional, já ultrapassada há muito tempo.
(Para terminar este primeiro post do blog sobre Gauguin serão três, contando com este, que se dedicou mais: a uma apresentação bioartística, motivos teóricos e conceituais, tradições e referências para o artista, antecipações motivadas por Gauguin para a arte moderna, e estudos mais detalhados de autorretratos e alguns retratos realizados, pelo artista, voltaremos a este tema, futuramente; além de termos falado de sua primeira fase impressionista-simbolista, sem perder de vista que ele está aqui neste post, em processo de amadurecimento, que passará por fases dos exílios na Bretanha e na Polinésia Francesa, pontos culminantes de suas obras, a maioria formada por obras-primas da modernidade das artes visuais; além de alguns retornos a Paris e outros locais; até chegar a uma estagnação e decaída qualitativa em sua produção artística, já para antecipar a vós, leitores; voltaremos também a sua relação positiva-negativa com Van Gogh.  Ah, quanto ao Autorretrato com Cristo Amarelo, voltaremos abordá-la junto às obras Cristo Crucificado (Cristo Amarelo) e Vaso Autorretrato em Forma de Cabeça Grotesca, já que estas duas obras de Gauguin estão reunidas no autorretrato referido, anteriormente, num tríptico, por assim dizer primoroso.).
Para finalizar por aqui, como dizíamos: vale ressaltar o retrato do amigo que não o abandonou neste momento, antes dos parênteses longo e explicativo da proposta geral deste meu trabalho, abordamos os autorretratos de motivo religioso e o abandono dos amigos que não o compreendiam mais; porém, o retratado agora é um amigo que acompanhou Gauguin na costa da Bretanha, Jacob Meyer de Haan, que Gaugin desenhou segundo a própria imagem, ironicamente demoníaca, para revestir um móvel na sala de almoço de uma pousada local. O jovem aparece retratado numa posição de pensador e, fervoroso simpatizante de ideias teosóficas e schopenhauerianas, olha de maneira perturbada e meditativa para dois livros: Sartor Resartus, de Carlyle e Paraíso Perdido, de Milton. Manuais dos poetas malditos do Simbolismo decadentista, com os quais Gauguin se identificava, como já exposto”. 

Retrato de Jacob Meyer de Haan. 1889:

        


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

GAUGUIN-VOLUME 8-ANNA MAZZANTI [PERFIL]; ELIANA PRINCI [OBRAS]-TRADUÇÃO DE MÔNICA ESMANHOTTO E SIMONE ESMANHOTTO. COLEÇÃO GRANDES MESTRES VOL. 8. SÃO PAULO: ABRIL, 2011.

(“TARDE DEMAIS”, EUA, 1949, WILLIAM WYLER): (MELODRAMA AMBIENTADO NO SÉCULO XIX, CONTUDO, ATUALÍSSIMO, SOB OUTRAS FORMAS NO SÉCULO XXI”)

(“TARDE DEMAIS”, EUA, 1949, WILLIAM WYLER):

(MELODRAMA AMBIENTADO NO SÉCULO XIX, CONTUDO, ATUALÍSSIMO, SOB OUTRAS FORMAS NO SÉCULO XXI”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)


“"Tarde demais" (“The heiress”, 1949, EUA, William Wyler) se passa em meados do século XIX, em meio à sociedade machista da época e da Nova York, da Belle Époque, influenciada por tudo que vinha da Europa, em especial de Paris.

Catherine, a personagem vivida magistralmente por Olivia de Havilland é ingênua no começo do enredo do filme, mas em meio uma desilusão amorosa e um pai que apesar de querer o melhor para ela, é machista e quer que ela casa a qualquer custo, apesar de Cathy, não demonstrar interesse nesta empreitada para tão cedo.

Mas, a cidade e a sociedade impõem isso, ainda mais no século retrasado, e, quando a moça é rica, possui dote, e o pai quer continuar de alguma com seu legado de riqueza através da filha, mesmo o próprio progenitor a achando ‘sem graça’ e ‘idiota’.

Por isso mesmo, o pai de Catherine a trata severamente e sem carinho, não demonstrando amor para sua filha, na maioria dos momentos do filme; apesar de uma compreensão à situação amorosa vivida por sua filha e a personagem de Morris (Montgomery Clift), que só mais tarde Cathy entenderá o os motivos do pai e do pretenso noivo.

Voltando à relação pai e filha: os diálogos dele para com ela beiram a grosseria; tudo isso e mais um pouco transforma Catherine (Havilland), a menina inocente e pura, numa mulher amarga e envelhecida pelo desgosto e desamor, ódio e rancor a tudo e a todos.


Grande atuação de Havilland. Destaque para a participação de Clift. Melodrama de Wyler que surpreende positivamente.

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

(“BEPPO: UMA HISTÓRIA VENEZIANA, LORD BYRON, 1818”): (“BEPPO: UMA ANTECIPÇÃO DE DON JUAN; A OITAVA-RIMA SATÍRICA; A FASE MADURA DE BYRON”)

(“BEPPO: UMA HISTÓRIA VENEZIANA, LORD BYRON, 1818”):

(“BEPPO: UMA ANTECIPÇÃO DE DON JUAN; A OITAVA-RIMA SATÍRICA; A FASE MADURA DE BYRON”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)




Preâmbulos:
À luz desesperante a fronte dos humanos
Tinha um aspecto não terreno, se espamódicos
Neles batiam os clarões; alguns, por terra,
Escondiam chorando os olhos; apoiavam
Outros o queixo às mãos fechadas, e sorriam;
Muitos corriam para lá e para cá,
Alimentando a pira, e a vista levantavam
Com doida inquietação para o trevoso céu,
A mortalha de um mundo extinto; (...)
(“Trevas”, Byron).

   
Beppo: uma história veneziana ”, obra escrita em 1817, por Lord Byron. O escritor que foi idolatrado e reconhecido em vida, tanto na Inglaterra, Europa, quanto no Brasil, por exemplo, em especial entre os poetas românticos do mal-do-século. Porém, após as primeiras décadas do século XX, os movimentos do Modernismo Literário e Artístico, segundo Pulo Henriques Britto (2014), viram Byron como um anacronismo. “Sua postura retórica, seus excessos sentimentais, sua linguagem bombástica, seu convencionalismo formal pareciam falsos e vazios” (BYRON, 2014, p. 12).
Contudo, nada foi mais prejudicial para o status literário de Byron, que a visão modernista teórica de Lírica, que via esta como forma da qual o poeta soubesse “explorar os recursos do idioma com virtuosismo” (Idem). O lírico-poético é tão indissolúvel no idioma, da mesma maneira que o significado e a semântica do poema está ligada à individualidade da experiência subjetiva do poeta, trabalhada em um pensar poético e num poetizar pensante.
“Forma justamente esses os valores que a crítica anglo-saxônica moderna encontrou em Blake, Wordsworth, Coleridge, Shelley e Keats – e não achou na obra de Byron, contemporâneo deles.” (Ibidem., p. 13). Basta mencionar os estudos pioneiros do início do século XX, de M. H. Abrams, em sua obra-prima teórica literária O espelho e a lâmpada, que também vai ao encontro dos estudos daqueles e do tradutor e estudioso de Lord Byron, no Brasil, Paulo Henriques Britto.
Contudo, em contraste ao poeta ilegível, do ultrarromantismo, há segundo, Britto (2014), um outro Byron, “O Byron da maturidade, autor de três poemas satíricos – Beppo, The Vison of Judgment e Don Juan – que, embora em seu tempo não tenham alcançado a popularidade das narrativas românticas, (...), hoje têm seu mérito reconhecido pela crítica.” (Idem).
Em especial, Don Juan, considerado por muitos uma obra-prima. É quase impossível dissociar vida pessoal do autor da sua obra literária, por isso por parte da crítica literária considerar suas cartas e diários, “o que há de melhor em Byron, ao lado dos três grandes poemas satíricos da maturidade.” (Idem). Para Britto: “Byron é um excelente escritor, talvez até um grande escritor, mas não um grande poeta. Suas virtudes são essencialmente as de um bom prosador.” (Ibidem., p. 14).
O escritor do século XIX, portanto, utiliza a poesia como suporte para a narrativa, a exposição detalhada e os argumentos irônicos e sarcásticos. Os poemas dramáticos de Byron, por exemplo, foram escritos para serem lidos e não encenados, como ele mesmo adverte. Para a crítica literária atual, que se propõe a analisar a obra per si, em que o psicologismo do autor é desconsiderado; a biografia do autor não é considerada para análise da sua obra literária.
Mas, então Byron, que se não conhecêssemos sua vida e o que ele representou (e representa) para a vida artística ocidental durante um século, seus escritos teriam uma significância e importância menores. Porém, sabemos que Lord Byron foi e representou (a) com sua obra, ao menos um valor histórico-literário inegável. Por isso devemos ver sua obra de uma forma que:

Se sua vida e sua obra estão indissoluvelmente ligadas, parece razoável encará-las como um todo orgânico. Nada poderia ser mais alheio aos preceitos da crítica atual, mas talvez um autor tão fora de moda, tão distante das concepções contemporâneas de poesia, só possa ser mesmo ser apreendido desse modo. (BYRON, 2014, p. 15).













BEPPO: UMA ANTECIPÇÃO DE DON JUAN:
Ah! Tivesse uma pena leve e profusa
Pra subir até o cume do Parnasso,
Lá, onde ficam a escrevinhar as Musas
Esses versinhos de sucesso fácil,
Eu haveria de compor às dúzias,
Relatos sírios, assírios ou trácios,
Poemas do mais fino orientalismo,
Com ocidentalíssimo pieguismo.
(“LI”, Beppo: uma história veneziana.
Byron)..





Beppo: uma história veneziana texto poético-narrativo escrito, em 1817, porém, Byron, já abandonara a companheira Clare e sua segunda filha, Allegra; o escritor continuava com suas viagens e estudos e, no final do ano de 1816, chegou a Veneza. Imediatamente se relaciona com Marianna Segati, esposa de um comerciante. Relaciona-se também com Margarita Cogni, por dois anos.
Em 1817, chega às mãos de Lord Byron – um exemplar de “Whistlecraft”, poema satírico-heroico em oitava rima recém-publicado, de autoria de John Hookham Frere. Byron reconheceu nesta obra humorística composta em oitava rima, uma forma pouco utilizada na Inglaterra, o que levou à reflexão de que não ficara totalmente satisfeito com a estrofe spenseriana, que usara em Childe Harold. Porém, Byron percebeu as possibilidades poéticas da oitava riam, já utilizadas na épica portuguesa por Camões, n´Os Lusíadas.   
Segundo Leslie Alexis Marchand, o poema de Frere “passeava com total abandono coloquial por diversos assuntos, incidentes e personagens” (MARCHAND,1957, p. 709). As características semântico-formais da composição descritas pelo biógrafo byroniano -, e que citaremos a seguir (LACERDA, http://www.revistazunai.com/ensaios/daniel_lacerda_lordbyron.htm , último acesso, 21 de setembro de 2016, às 15h14) -, na realidade antecipam com precisão e atestam o decisivo influxo que o “Whistlecrat” teria sobre o último e mais profícuo Byron. Senão, vejamos:

sua falta de unidade, suas digressões, seu engenho epigramático, sua irônica deflação de sentimentos, enfatizada pelos versos cortantes dos dísticos finais das estrofes de oito linhas, seu tom conversacional, os retratos anti-heroicos dos personagens e o desarmante realismo de sua interpretação de vida fez dele um meio ideal para o intento de Byron. (Idem).


O ‘tom conversacional’ e, também, de sua irônica reflexão sobre a língua inglesa. Defendendo a adoção de um vocabulário mais coloquial, menos pomposo. Ambas as características certamente devem ter sido as molas propulsoras do entusiasmo de Byron acerca da obra de Frere.
Em Beppo, Byron utiliza a estrofe com padrão de rimas ababcc; ou seja, seis versos com rimas alternadas, que são seguidas por um dístico rimado. Este recurso rímico, abriu espaço para sua faceta humorística: a terceira rima, mais difícil de encontrar, é, portanto, na maioria das vezes ‘forçada’, segundo Britto (2014). Porém, os dois últimos versos, rimando entre si, é uma explosão em forma de desfecho de uma piada sarcástica e jocosa.
Lord Byron assim escreveu sua primeira obra-prima em oitava-rima, ainda em 1817, Beppo: uma história veneziana, publicada em 1818. Era diferente de tudo que escrevera, “diferente das narrativas anteriores, era satírica e não romanesca; diferente das sátiras anteriores, era narrativa e não dissertativa. ” (BYRON, 2014, p. 27).
O enredo é uma anedota sarcástica e com suas inúmeras digressões, a voz do narrador elabora um humorístico e irônico panorama da sociedade veneziana de então; entremeado por ironias dirigidas à Inglaterra e às instituições inglesas, aos poetas ingleses de seu tempo. Não sobrou para ninguém e para nada, a ironia corrosiva fez muitas pessoas vestirem a carapuça, inclusive suas duas amantes venezianas, Segati e Cogni.
Sua segunda obra-prima madura em oitava-rima é The visiono of judgment, um sarcasmo ao puxa-saquismo de Southey ao rei Jorge III, à época, recentemente falecido. Southey era o poeta laureado do reino, que Byron detestava.
  Porém, sua obra-prima máxima em oitava-rima é Don Juan, escrito em 1819 e que ficou inacabado com a morte súbita do poeta. Contudo, Byron já antecipa a qualidade estética de Don Juan, em Beppo:
com suas rimas jocosas, a narrativa como pretexto para a sátira de costumes, o tom coloquial e íntimo, e principalmente a voz do narrador, o verdadeiro protagonista de Beppo tanto quanto de Don Juan, uma voz ferina, irreverente, a perder-se em digressões infindáveis, a fazer comparações entre Inglaterra e Europa continental, entre figuras históricas ou mitológicas e personagens totalmente desprovidos de grandeza. (BYRON, 2014, p. 27).


Em sua primeira obra-prima da maturidade em oitava-rima, Lord Byron rompe conscientemente com seu estilo anterior, chegando a ridicularizar suas narrativas orientais anteriores, de sucesso, inclusive, à época. Contudo, este rompimento é parcial, pois até em Don Juan, se encontram passagens de um sentimentalismo exagerado. Porém, não tem como negar que ocorreu uma evolução estilística, a persona lírica anterior é puramente ‘narcisística’ e já o Byron satírico, maduro, é um home voltado para a realidade a seu redor, e mesmo atuante sobre a mesma.”


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
OBRAS DE GEORGE GORDON, LORD BYRON:
BYRON, Lord. Beppo – Uma História Veneziana. Trad. Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2014.
------------------. Poemas. Organização e Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos.  São Paulo: Hedra, 2008.

OBRAS GERAIS:
“O romântico neoclássico.” Paulo Henriques Britto. In: Beppo – Uma História Veneziana. Trad. Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2014.

LINKS:

http://www.revistazunai.com/ensaios/daniel_lacerda_lordbyron.htm. Daniel Lacerda. Último acesso, 21 de setembro de 2016, às 15h14).

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

(““TEMPESTADES D´ALMA”, FRANK BORZAGE, 1940”): (“A MUDANÇA RADICAL NAS RELAÇÕES FAMILIARES E SOCIAIS E NA HUMANIDADE: UMA TEMPESTADE TREVOSA PARA O MUNDO”)

(““TEMPESTADES D´ALMA”, FRANK BORZAGE, 1940”):

(“A MUDANÇA RADICAL NAS RELAÇÕES FAMILIARES E SOCIAIS E NA HUMANIDADE: UMA TEMPESTADE TREVOSA PARA O MUNDO”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO):




“Tempestades D´Alma” (“The mortal storm”, Frank Borzage, EUA, 1940): conta a história da família Roth, que vive no interior da Alemanha. O pai, professor Roth é um acadêmico renomado. Podemos notar isso na cena em que ele é homenageado por seus alunos, logo no início do filme, numa belíssima cena, em ocasião de seu aniversário. Professor Roth, e sua esposa têm dois filhos: Rudi e Freya; Otto e Erich são filhos do primeiro casamento da Sra.Roth, vivem com a família também. Está tudo tranquilo na vida familiar, até a empregada da família interromper o jantar para anunciar que Hitler foi nomeado chanceler da Alemanha. A partir daí a vida da família muda radicalmente e para um caos tempestuoso, da mesma maneira que mudou a História da Humanidade a partir daquela nomeação de Adolf Hitler para chanceler.
O filme vai mostrando aos poucos, num tom crescendo de efeito de borrasca, os efeitos da ascensão do nazismo sobre essa família. Otto e Fritz (rapaz que iria se casar com Freya) filiam-se ao Partido Nazista. Martin Breitner (James Stewart), amigo dos dois, não compartilha da mesma visão deles, não acha que a Alemanha deve ser salva, por isso é excluído do círculo de amizades. Professor Roth é hostilizado por seus alunos, todos filiados ao Partido Nazista, que se recusam ter aulas com um professor judeu. Só que antes estes mesmo alunos admiravam e adoravam o Professor Roth, participando inclusive da cena inicial de homenagem ao acadêmico, na universidade no dia do seu aniversário. Freya, que iria se casar com Fritz já não sabe mais se vai fazê-lo, pois estar apaixonada por Martin -, o homem que é desprezado por todos da cidade, pois não compartilha das ideias fascistas de agora, com quem nenhum alemão de ‘verdade’ pode travar relações. Exceto Freya, e, o Sr. e a Sra. Roth, que continuam com a amizade recíproca a Martin. E mais uns poucos não fascistas da cidade, pois são justamente judeus.
Mas os estadunidenses da produtora MGM não atacaram de vez o Nazismo, neste filme claramente de propaganda antinazista. Pois, ficam os produtores da MGM com receio de chamar judeus de judeus no roteiro e nos diálogos do filme, usando o eufemismo de ‘não arianos’. É aí que está o maior problema e defeito desta película: o filme não toma partido dos judeus, embora mostre os horrores que fizeram os Nazistas e o Eixo, durante a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto, a eles, ‘judeus’, com orgulho!
A grande maioria dos chefões de estúdio (MGM, então!) era de judeus, nos EUA. Imagina-se que eles seriam os maiores lutadores contra o antissemitismo e o nazismo, afinal de contas ninguém mais do que eles sabiam como era enfrentar todo esse preconceito. Mas não. Os produtores dos estúdios venderam armamento para a Alemanha; não defendiam suas origens, pois: tinham medo de perder mercado; se identificavam mais como americanos do que como judeus e, a política de colaboração com a Alemanha deixara marcas muito profundas. Por causa disso, Tempestades d´alma foi mutilado.”

“A TÍTULO DE CURIOSIDADE:

(“A Segunda Guerra Mundial tinha aquele poder citado no parágrafo anterior no fim do mesmo. Que na verdade já vinha de antes, do estouro da Guerra; toda vez, que Hollywood produzia um filme antinazista, os dois países entravam em acordo, para não interferir nos lançamentos dos filmes na Europa, Alemanha, e, na América do Norte, nos Estados Unidos, o que gerava no fim das contas: ou engavetamento das obras; não realização/fim das filmagens mal iniciadas ou dos filmes paralisados ainda em pré-produção; mutilação; ou perda criminosa dos negativos. Como se pode imaginar a Guerra afetou a distribuição dos filmes no mundo. Hitler cortou pela metade a receita de Hollywood na Alemanha. Hollywood e a MGM tentaram quebrar esse acordo/pacto em Tempestades d’Alma”, que foi, de fato, o primeiro filme antinazista significativo. Com as ressalvas já feitas na crítica, entretanto.”)”.



segunda-feira, 12 de setembro de 2016

(“O MATADOR”, HENRY KING, 1950): (“UM WESTERN PSICOLÓGICO CLÁSSICO E PARADIGMÁTICO: DEFINIU O RUMO DO WESTERN DOS ANOS 1950 EM DIANTE”)

(“O MATADOR”, HENRY KING, 1950):

(“UM WESTERN PSICOLÓGICO CLÁSSICO E PARADIGMÁTICO: DEFINIU O RUMO DO WESTERN DOS ANOS 1950 EM DIANTE”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO):





“Henry King é um cineasta de altos e baixos. Mas, quando acertava, sempre era muito o que muito bom o que ele fazia. E geralmente tornava-se clássica, a película que fazia; apesar da maioria destes filmes, não serem à época sucesso de público e até não serem bem recebidos pela crítica especializada contemporânea.

Só o tempo, daria o status aos seus filmes de clássicos, a grande maioria, por sinal; e, de o diretor de cinema dos Estados Unidos da América mais confiável para os estúdios e os produtores de cinema da sua época. Estes dois fatos últimos já eram percebidos pela 20th Century-Fox e pelo produtor desta Darryl F. Zanuck à época.

Tanto que De Toth, então mais famoso pelos fuxico em sua vida pessoal, do que pelos bons filmes que fazia. De Toth e Nunnaly Johnson trabalhavam no roteiro para o cinema de “O Matador”, que seria filmado por André De Toth e produzido por Johnson para a 20th Century-Fox. Quando Darryl F. Zanuck, o diretor de produção do estúdio percebeu o potencial daquele western em estágio de escrita, dispensou De Toth e entregou a direção ao mais confiável diretor da casa, chegara a vez de Gregory Peck fazer parceria constante com Henry King, depois daquela que King firmara com Tyrone Power.

“O Matador”, o qual para o primeiro crítico de cinema a reconhecer, que esse filme de King era sensacional e clássico, já desde o lançamento nos cinemas estadunidenses, em 1950.  O crítico referido é o prestigiado Everson, que afirma que os muitos prêmios e fama conquistados por “Matar ou Morrer” (High Noon), de 1952, deveriam ser atribuídos a “O Matador”, do qual o filme de Fred Zimmermann usurpou as inovações e o equilíbrio artístico e cinematográfico, que o consagraram. Para Everson, “O Matador” é uma obra-prima que abre a década de 1950 como um western que muda os rumos dos faroestes dos EUA naquela década, para adiante, que culminou em 1992, com “Os Imperdoáveis”, dirigido e protagonizado por Clint Eastwood.

Detalhe extra, mas fundamental para os novos rumos do western americano, e, até do subgênero que sugeria depois, o bang bang italiano: o bigode de Gregory Peck -, para compor a imagem do pistoleiro Jimmy Ringo foi pedido a Gregory Peck que deixasse crescer o bigode. Jimmy Ringo em nada lembrava o extravagante Lewt McCanles que Peck interpretara no grande êxito comercial que havia sido “Duelo ao Sol”, uma obra prima de grande atuação de Peck e dirigida por King Vidor, um western também à frente do seu tempo.

O fato era que Jimmy Ringo não lembrava nenhum mocinho de outros westerns. Contudo, após duas semanas de filmagens o presidente da Fox, Skouras assistiu a alguns trechos do filme já filmados e, se desesperou com o que viu: o maior astro do estúdio totalmente sem glamour, e com um bigode para Skouras, ridículo e que poria o filme todo a perder e principalmente a dar prejuízos financeiros ao estúdio.



Jimmy Ringo (Gregory Peck) e Mark Street (Millard Mitchell) foram antigos companheiros num bando de fora-da-lei. Ringo ganhou notoriedade por ser um gatilho muito rápido. Após se separarem Mark Street preferiu seguir caminho diferente e tornou-se o xerife de Cayenne, impondo a lei e ordem com rigor no pequeno lugarejo. Peggy Walsh (Helen Westcott), a esposa de Jimmy Ringo, com o filho Jimmie vivem em Cayenne, onde ela é professora e usa o sobrenome Walsh. Incógnita, somente Mark Street e a cantora de saloon Molly sabem que Peggy é esposa do pistoleiro.

Peggy cansou-se da vida irregular que levava com Jimmy Ringo e afastou-se dele. Passando por uma outra cidade onde foi reconhecido, Jimmy Ringo foi obrigado a matar, em legítima defesa, um jovem provocador, que se achava o pistoleiro mais rápido do mundo, até que Ringo ruma para a vila em que está sua esposa, para convencer ela da possibilidade de constituírem vida nova em um lugar distante onde ele não seja reconhecido.

O que fez de "O Matador" um western importante é inicialmente o tema inusitado do pistoleiro que tenta fugir da fama e do peso da consciência que carrega. Heróis dos faroestes sempre foram homens invencíveis, determinados e sem aparentes problemas psicológicos que pudessem afligi-los por matar. Jimmy Ringo saboreou na juventude a fama de pistoleiro invencível.

Mas, o segundo aspecto importante de "O Matador" é sua concepção artística e cinematográfica (ponto para King que concebe a o todo do western), baseada num roteiro bastante dialogado, que explica, o primeiro aspecto importante de inovação sem tiroteios despropositados, sem exageros de violência física. O que existe é uma claustrofobia, que acontece, em sua maior parte nos diálogos travados no 'Palace Saloon' dirigido por Mac (Karl Malden) e com uma notável economia de ação e cenários que mais valorizam a intenção de mostrar o lado humano de Ringo, são esses elementos que tornam o western de Henry King um admirável filme. Um drama-western, um filme psicológico e denso, reflexivo, tenso e com alta densidade de diálogos e pensamentos, pressão psicológica, em detrimento do excesso de violência física que já acompanhava os westerns americanos há muito tempo. Inaugurando um novo subgênero o anti-western, o western psicológico. Está aí mais uma inovação de King junto principalmente à primorosa atuação de Peck, que confirma tudo isso. Surgindo um clássico, uma obra-prima do cinema como um todo.



Se necessário fosse destacar um único ponto importante de "O Matador", esta seria a extrema simplicidade da sua produção e que resultou num clássico absoluto. “O Matador” tem a esplêndida a fotografia de Arthur C. Miller, e Alfred Newman responde pela trilha sonora, discreta como o filme pedia, como sempre ele fez em todos os seus trabalhos, sempre com uma trilha condizente com os filmes em que ele trabalhou, em consonância com a temática e cenas de cada um, “O Matador” esta qualidade é perceptível em alto grau.


No aspecto financeiro “O Matador” não chegou a dar prejuízo porque os fãs de westerns e fãs de Gregory Peck foram assistir ao filme de Henry King, mas ficou longe de dar o lucro que a 20th Century-Fox esperava. E Skouras quando encontrou Gregory Peck disse a ele que aquele bigode fora o responsável pelo fracasso de “O Matador”. O presidente da Fox não percebeu, que, o trabalho de King e Peck era visionário e, nas décadas seguintes seria cada vez mais difícil encontrar um cowboy de rosto limpo e que aquele western com Gregory Peck seria, para muitos críticos, o melhor de toda a carreira do ator e uma das suas melhores interpretações dentre todos os seus créditos como ator.”


domingo, 11 de setembro de 2016

(“OS 47 RONINS”, KUNIO WATANABE, 1958): (“VINGANÇA HONROSA E COLORIDA”)

(“OS 47 RONINS”, KUNIO WATANABE, 1958):

(“VINGANÇA HONROSA E COLORIDA”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)



“A lendária história dos samurais vingadores, 47 ronins, adaptada brilhantemente, várias vezes, em especial em 1941-42, em duas partes, por Mizoguchi, em belíssima fotografia em preto-e-branco e, riquíssimo trabalho no roteiro.
É adaptada a lenda dos 47 ronins, de novo, em 1958, agora dirigida por Kunio Watanabe, uma superprodução de belíssima fotografia colorida, realizada pelos estúdios Daiei. Watanabe um especialista em filmes chambaras, realiza uma obra-prima inesperada por todos, ante o trabalho anterior de Mizoguchi, primoroso. Protagonizado por Kazuo Hasegawa e Shintaro Katsu, da série Zatoichi.
A sinopse é a mesma: “O jovem Lord Asano é muito empenhado nas questões de protocolo perante o Imperador. Mas é sempre gozado e hostilizado pelo vaidoso Lord Kira. Um dia, a brincadeira chega ao ponto de humilhação e Asano tenta desforrar-se sobre Kira. Mas quebra as regras e é obrigado a cometer seppuku.” (link: https://agrandeilusaocaminha.wordpress.com/2014/10/17/the-loyal-47-ronin-1958/ , por by hussardo.).

Comum a todas as diversas adaptações que já tinham sido realizadas, e, viriam a ser realizadas -, como a de 1962, também uma obra-prima, esta dirigida por Hiroshi Inagaki, outro especialista no gênero chambara -, permanece sempre, e, aqui no trabalho excelente de Watanabe também a ilustração detalhada dos eventos, das motivações e emoções, sempre com forte ênfase no bushido, o código samurai medieval. Que preza pela honra, lealdade e transcendência do espírito samurai em vida-morte.”