quarta-feira, 21 de setembro de 2016

(“BEPPO: UMA HISTÓRIA VENEZIANA, LORD BYRON, 1818”): (“BEPPO: UMA ANTECIPÇÃO DE DON JUAN; A OITAVA-RIMA SATÍRICA; A FASE MADURA DE BYRON”)

(“BEPPO: UMA HISTÓRIA VENEZIANA, LORD BYRON, 1818”):

(“BEPPO: UMA ANTECIPÇÃO DE DON JUAN; A OITAVA-RIMA SATÍRICA; A FASE MADURA DE BYRON”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)




Preâmbulos:
À luz desesperante a fronte dos humanos
Tinha um aspecto não terreno, se espamódicos
Neles batiam os clarões; alguns, por terra,
Escondiam chorando os olhos; apoiavam
Outros o queixo às mãos fechadas, e sorriam;
Muitos corriam para lá e para cá,
Alimentando a pira, e a vista levantavam
Com doida inquietação para o trevoso céu,
A mortalha de um mundo extinto; (...)
(“Trevas”, Byron).

   
Beppo: uma história veneziana ”, obra escrita em 1817, por Lord Byron. O escritor que foi idolatrado e reconhecido em vida, tanto na Inglaterra, Europa, quanto no Brasil, por exemplo, em especial entre os poetas românticos do mal-do-século. Porém, após as primeiras décadas do século XX, os movimentos do Modernismo Literário e Artístico, segundo Pulo Henriques Britto (2014), viram Byron como um anacronismo. “Sua postura retórica, seus excessos sentimentais, sua linguagem bombástica, seu convencionalismo formal pareciam falsos e vazios” (BYRON, 2014, p. 12).
Contudo, nada foi mais prejudicial para o status literário de Byron, que a visão modernista teórica de Lírica, que via esta como forma da qual o poeta soubesse “explorar os recursos do idioma com virtuosismo” (Idem). O lírico-poético é tão indissolúvel no idioma, da mesma maneira que o significado e a semântica do poema está ligada à individualidade da experiência subjetiva do poeta, trabalhada em um pensar poético e num poetizar pensante.
“Forma justamente esses os valores que a crítica anglo-saxônica moderna encontrou em Blake, Wordsworth, Coleridge, Shelley e Keats – e não achou na obra de Byron, contemporâneo deles.” (Ibidem., p. 13). Basta mencionar os estudos pioneiros do início do século XX, de M. H. Abrams, em sua obra-prima teórica literária O espelho e a lâmpada, que também vai ao encontro dos estudos daqueles e do tradutor e estudioso de Lord Byron, no Brasil, Paulo Henriques Britto.
Contudo, em contraste ao poeta ilegível, do ultrarromantismo, há segundo, Britto (2014), um outro Byron, “O Byron da maturidade, autor de três poemas satíricos – Beppo, The Vison of Judgment e Don Juan – que, embora em seu tempo não tenham alcançado a popularidade das narrativas românticas, (...), hoje têm seu mérito reconhecido pela crítica.” (Idem).
Em especial, Don Juan, considerado por muitos uma obra-prima. É quase impossível dissociar vida pessoal do autor da sua obra literária, por isso por parte da crítica literária considerar suas cartas e diários, “o que há de melhor em Byron, ao lado dos três grandes poemas satíricos da maturidade.” (Idem). Para Britto: “Byron é um excelente escritor, talvez até um grande escritor, mas não um grande poeta. Suas virtudes são essencialmente as de um bom prosador.” (Ibidem., p. 14).
O escritor do século XIX, portanto, utiliza a poesia como suporte para a narrativa, a exposição detalhada e os argumentos irônicos e sarcásticos. Os poemas dramáticos de Byron, por exemplo, foram escritos para serem lidos e não encenados, como ele mesmo adverte. Para a crítica literária atual, que se propõe a analisar a obra per si, em que o psicologismo do autor é desconsiderado; a biografia do autor não é considerada para análise da sua obra literária.
Mas, então Byron, que se não conhecêssemos sua vida e o que ele representou (e representa) para a vida artística ocidental durante um século, seus escritos teriam uma significância e importância menores. Porém, sabemos que Lord Byron foi e representou (a) com sua obra, ao menos um valor histórico-literário inegável. Por isso devemos ver sua obra de uma forma que:

Se sua vida e sua obra estão indissoluvelmente ligadas, parece razoável encará-las como um todo orgânico. Nada poderia ser mais alheio aos preceitos da crítica atual, mas talvez um autor tão fora de moda, tão distante das concepções contemporâneas de poesia, só possa ser mesmo ser apreendido desse modo. (BYRON, 2014, p. 15).













BEPPO: UMA ANTECIPÇÃO DE DON JUAN:
Ah! Tivesse uma pena leve e profusa
Pra subir até o cume do Parnasso,
Lá, onde ficam a escrevinhar as Musas
Esses versinhos de sucesso fácil,
Eu haveria de compor às dúzias,
Relatos sírios, assírios ou trácios,
Poemas do mais fino orientalismo,
Com ocidentalíssimo pieguismo.
(“LI”, Beppo: uma história veneziana.
Byron)..





Beppo: uma história veneziana texto poético-narrativo escrito, em 1817, porém, Byron, já abandonara a companheira Clare e sua segunda filha, Allegra; o escritor continuava com suas viagens e estudos e, no final do ano de 1816, chegou a Veneza. Imediatamente se relaciona com Marianna Segati, esposa de um comerciante. Relaciona-se também com Margarita Cogni, por dois anos.
Em 1817, chega às mãos de Lord Byron – um exemplar de “Whistlecraft”, poema satírico-heroico em oitava rima recém-publicado, de autoria de John Hookham Frere. Byron reconheceu nesta obra humorística composta em oitava rima, uma forma pouco utilizada na Inglaterra, o que levou à reflexão de que não ficara totalmente satisfeito com a estrofe spenseriana, que usara em Childe Harold. Porém, Byron percebeu as possibilidades poéticas da oitava riam, já utilizadas na épica portuguesa por Camões, n´Os Lusíadas.   
Segundo Leslie Alexis Marchand, o poema de Frere “passeava com total abandono coloquial por diversos assuntos, incidentes e personagens” (MARCHAND,1957, p. 709). As características semântico-formais da composição descritas pelo biógrafo byroniano -, e que citaremos a seguir (LACERDA, http://www.revistazunai.com/ensaios/daniel_lacerda_lordbyron.htm , último acesso, 21 de setembro de 2016, às 15h14) -, na realidade antecipam com precisão e atestam o decisivo influxo que o “Whistlecrat” teria sobre o último e mais profícuo Byron. Senão, vejamos:

sua falta de unidade, suas digressões, seu engenho epigramático, sua irônica deflação de sentimentos, enfatizada pelos versos cortantes dos dísticos finais das estrofes de oito linhas, seu tom conversacional, os retratos anti-heroicos dos personagens e o desarmante realismo de sua interpretação de vida fez dele um meio ideal para o intento de Byron. (Idem).


O ‘tom conversacional’ e, também, de sua irônica reflexão sobre a língua inglesa. Defendendo a adoção de um vocabulário mais coloquial, menos pomposo. Ambas as características certamente devem ter sido as molas propulsoras do entusiasmo de Byron acerca da obra de Frere.
Em Beppo, Byron utiliza a estrofe com padrão de rimas ababcc; ou seja, seis versos com rimas alternadas, que são seguidas por um dístico rimado. Este recurso rímico, abriu espaço para sua faceta humorística: a terceira rima, mais difícil de encontrar, é, portanto, na maioria das vezes ‘forçada’, segundo Britto (2014). Porém, os dois últimos versos, rimando entre si, é uma explosão em forma de desfecho de uma piada sarcástica e jocosa.
Lord Byron assim escreveu sua primeira obra-prima em oitava-rima, ainda em 1817, Beppo: uma história veneziana, publicada em 1818. Era diferente de tudo que escrevera, “diferente das narrativas anteriores, era satírica e não romanesca; diferente das sátiras anteriores, era narrativa e não dissertativa. ” (BYRON, 2014, p. 27).
O enredo é uma anedota sarcástica e com suas inúmeras digressões, a voz do narrador elabora um humorístico e irônico panorama da sociedade veneziana de então; entremeado por ironias dirigidas à Inglaterra e às instituições inglesas, aos poetas ingleses de seu tempo. Não sobrou para ninguém e para nada, a ironia corrosiva fez muitas pessoas vestirem a carapuça, inclusive suas duas amantes venezianas, Segati e Cogni.
Sua segunda obra-prima madura em oitava-rima é The visiono of judgment, um sarcasmo ao puxa-saquismo de Southey ao rei Jorge III, à época, recentemente falecido. Southey era o poeta laureado do reino, que Byron detestava.
  Porém, sua obra-prima máxima em oitava-rima é Don Juan, escrito em 1819 e que ficou inacabado com a morte súbita do poeta. Contudo, Byron já antecipa a qualidade estética de Don Juan, em Beppo:
com suas rimas jocosas, a narrativa como pretexto para a sátira de costumes, o tom coloquial e íntimo, e principalmente a voz do narrador, o verdadeiro protagonista de Beppo tanto quanto de Don Juan, uma voz ferina, irreverente, a perder-se em digressões infindáveis, a fazer comparações entre Inglaterra e Europa continental, entre figuras históricas ou mitológicas e personagens totalmente desprovidos de grandeza. (BYRON, 2014, p. 27).


Em sua primeira obra-prima da maturidade em oitava-rima, Lord Byron rompe conscientemente com seu estilo anterior, chegando a ridicularizar suas narrativas orientais anteriores, de sucesso, inclusive, à época. Contudo, este rompimento é parcial, pois até em Don Juan, se encontram passagens de um sentimentalismo exagerado. Porém, não tem como negar que ocorreu uma evolução estilística, a persona lírica anterior é puramente ‘narcisística’ e já o Byron satírico, maduro, é um home voltado para a realidade a seu redor, e mesmo atuante sobre a mesma.”


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
OBRAS DE GEORGE GORDON, LORD BYRON:
BYRON, Lord. Beppo – Uma História Veneziana. Trad. Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2014.
------------------. Poemas. Organização e Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos.  São Paulo: Hedra, 2008.

OBRAS GERAIS:
“O romântico neoclássico.” Paulo Henriques Britto. In: Beppo – Uma História Veneziana. Trad. Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2014.

LINKS:

http://www.revistazunai.com/ensaios/daniel_lacerda_lordbyron.htm. Daniel Lacerda. Último acesso, 21 de setembro de 2016, às 15h14).

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