sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

Galáxias, Haroldo de Campos: Poemas constelares - o livro enquanto viagem.




 "Galáxias", de Haroldo de Campos, é um livro que é uma "viagem", uma viagem enquanto livro. Que está sendo escrito e reescrito no próprio processo de re-escritura enquanto tona-se livro. Campos já afirma que o livro não é um livro de viagem, mas o próprio livro é uma viagem enquanto livro. O poeta em sua proposta metalinguística e intertextual nos dá um galáctico livro constelar que se pretende uma obra total, consciente de que não poderá nunca ser totalizante, apenas mais uma espetacular re-criação de uma nova constelação literária. Mallarmaico em muitos momentos, mas também rosiano, enquanto livro sendo rio-constelar de palavras re-criadas. Livro de difícil entrada? Sim. Mas, que vale a pena, a viagem por seus versos constelares, que são desafiados pelos brancos das páginas e desafiam o branco da páginas. 

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Torto Arado, Itamar Vieira Júnior: O Semear Torto do Brasil Enquanto Nação.

 






"Torto Arado", de Itamar Viera Júnior, é um sopro de originalidade na Literatura Brasileira Contemporânea. Trazendo questões urgentes do Brasil do passado e do presente, mas também com grande investimento estético marcado por realismo e magia. O autor nos apresenta uma narrativa, que assim como a História da nação brasileira é torta, e, por isso mesmo, são dignas de serem re-contadas. E, da mesma forma, são importantes de serem ressignificadas e reconstruídas. Justamente, por esses caminhos tortos, por esse "arado torto" e, por esse "semear torto" é que o nosso país é construído enquanto nação. Fica, assim, o sopro da vida a dizer: a resistência se faz, dessa maneira, tanto na vida, como na arte, por caminhos e linhas tortas, pelo arado torto das nossas existências, enquanto povo brasileiro.

quarta-feira, 22 de setembro de 2021

"Eu", Walter Hugo Khouri, Brasil, 1987: A Busca por Tudo... e pelo Nada.

 



Eu” é mais uma daquelas obras polêmicas dirigidas por Walter Hugo Khouri, lançada em 1987. Porém, muito acima da média das produções nacionais da década de 1980, apesar de possivelmente não ser seu melhor trabalho. Khouri era um exímio cineasta, introspectivo e detalhista em seus roteiros e filmes. É o caso de “Eu”. Estrelado por Tarcísio Meira, com seus olhares que demonstram o vazio e a crise existenciais da personagem Marcelo, em crise com a sua idade avançando, sentindo a chegada da morte, ou a ansiando, a crise da meia-idade. Desejando todas as mulheres, um apetite sexual voraz, mas também uma busca por tudo e por nada, com viés até mesmo de fundo niilista. Marcelo exemplifica também o predador capitalista, burguês, que usa as outras pessoas, as coisificando e as considerando todas insignificantes, o que constitui por si só em um pensamento paradoxal. Ou seja, o filme apesar de um caráter predominantemente introspectivo e existencialista, tem algumas sugestões ou reflexões sobre questões sociais e políticas nos diálogos. A galeria de personagens femininas é riquíssima: Lila (Nicole Puzzi) projeta seus desejos incestuosos em relação ao seu pai em Marcelo; Renata (Monique Lafond), junto a Lila, desenvolve um trio sexual com Marcelo e, também agencia outras garotas para Marcelo, como a explosiva e sensual Diana (Monique Evans), que desde o começo seduz Marcelo; Beatriz (Christiane Torloni) é uma psicanalista amiga da filha de Marcelo, Berenice (Bia Seidl) que é estudante de psicologia e muito admira Beatriz. Ou até mais... Beatriz desperta uma paixão tardia em Marcelo. E Marcelo e sua filha desenvolvem uma relação de muito amor, respeito e admiração entre si, mas também de repulsa e estranhamento. Marcelo toma atitudes autodestrutivas que vão minando suas relações sociais e afetivas. Os conflitos desenvolvidos em relação a toda essa quantidade de mulheres, todas reunidas em um mesmo espaço, a casa de praia da família de Marcelo, localizada em uma península isolada, demonstram um homem orgulhoso, autoconfiante, voraz, porém que demostra insegurança, infantilidade, imaturidade e até demonstra ser um homem mimado. Todas estas características de sua personalidade refletem, sobretudo, em um homem, tipicamente, burguês e playboy, mulherengo, egocêntrico, megalômano, egoísta e individualista, um destruidor de tudo, de todos e de si mesmo.  

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Os Documentos da Yakuza-Kinji Fukasaku-Japão-1973/1974: épica série de cinema sobre a máfia japonesa.

 









Os Documentos da Yakuza é uma série de cinema policial japonesa dividida em cinco filmes idealizada pelo cineasta Kinji Fukasaku, que também dirigiu os ótimos Portal do Inferno (1981), A Conspiração do Clã Yagyu (1978) e Guerra de Gangues em Okinawa (1971), além de ter dirigido as cenas japonesas do épico de guerra Tora! Tora! Tora! (1970). Os filmes da série Documentos da Yakuza chegaram aos cinemas entre os anos de 1973-1974 e retratam de forma nua, crua e dura a violência promovida pelas gangues e os diversos clãs da máfia japonesa da Yakuza desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Ex-soldados japoneses da Guerra desamparados, frustrados e pobres são tragados pela máfia, para fazer parte de seus diversos clãs, atuando na jogatina, no comércio ilegal de bebidas e até no tráfico de outras drogas com o passar e a sofisticação da Yakuza, no mercado ilegal, etc. Shozo Irono é um deles. Shozo é interpretado pelo astro japonês desse gênero de filmes, Bunta Sugawara. No Japão de 1947, ele entra para um clã e até chegar aos anos 1970, em sua trajetória no crime, ele percebe que muitos jovens desiludidos saíram de uma Guerra Mundial para entrar em uma espécie de guerra civil, em que sempre que ganha são os mais poderosos e os mais fortes e os mais fracos (jovens) são apenas usados (mortos) para manter uma mínima parcela no comando da máfia Yakuza. A guerra fraticida dentro da Yakuza é deflagrada em quatro momentos de extrema violência e sanguinolência ao longo da série de filmes, até que a sociedade civil japonesa, em especial com a chegada da Tocha Olímpica em Tóquio, 1964, clama para a intervenção da polícia até então conivente e, principalmente, subornável e corrupta. Sem contar os políticos corruptos, que tinham acordos inescrupulosos e ganhavam muito com a Yakuza. Shozo testemunha um movimento nos anos 1970 em que Yakuza tenta mostra uma faceta nova para o Japão, uma faceta de partido e organização política, a Tensei, mas que não difere muita da velha Yakuza, pois Yasukas sempre serão Yakuzas e, a guerra e a violência continuam iguais, somente variando em suas facetas e roupagens. Os filmes são excelentemente regulares, de extrema violência visual, com ótimos e originais ângulos de câmera. Cenas caóticas no bom sentido. Atuações bastante forçadas, mas que é uma característica dos filmes desse gênero, com uma ampla e diversificada galeria de personagens. Kinji Fukasaku de fato é um mestre do gênero Yakuza e realizou uma monumental obra, por muitos considerados O Poderoso Chefão japonês, que influenciou diretores como Quentin Tarantino e Takashi Miike.  Os filmes são: Luta Sem Código de Honra (1973), Duelo em Hiroshima (1973), Guerra Por Procuração (1973), Estratégias Policiais (1974) e Episódio Final (1974).    

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

A Voz da Lua - Federico Fellini - Itália/França - 1990: Ode à Loucura.

 




A Voz da Lua” é o último filme de Federico Fellini, lançado em 1990. Fellini, um dos mestres do cinema onírico e fantasioso, oferece ao espectador uma ode não só à Lua, mas, concomitantemente, à Loucura. Roberto Benigni interpreta Salvini, um sujeito lunático, louco, que vê (ou prefere ver) apenas o lado poético, lírico do mundo. Em suas razões e des-razões percebe, aos poucos que, talvez seja somente na e pela Loucura que seja possível entender as questões metafísicas do ser humano em relação às outras pessoas e, dessa forma, em relação ao próprio universo. Um roteiro que mostra momentos e situações que parecem apenas delírios, que de tão absurdas são por isso mesmo tão verossímeis. E isto é a própria essência da vida em sua dualidade, em seus opostos complementares: Razão e Loucura. Fellini é, de fato, um maestro em conduzir este louco concerto de situações inusitadas, elenco e extras em um caos (veja-se a cena da discoteca como exemplo disso), porém muito bem ordenado racionalmente e tendo um porquê: o caos da existência humana é a razão desarrazoada do prosseguir humano.     

terça-feira, 7 de setembro de 2021

"O Bandido da Luz Vermelha" - Rogério Sganzerla - Brasil - 1968: a western about the third world.

 


“O Bandido da Luz Vermelha'' is an amazing movie, released in 1968, captivating from the initial credits. So, this movie catches the viewer's attention from the beginning to end. The director is Rogério Sganzerla and the main actors are - Paulo Villaça as the outlaw and Helena Ignez as Janete Jane, a prostitute that the bandit develops a relationship. All have outstanding performances in their roles. This drama/thriller uses radio speakers as movie narrators through the plot. The movie is a criticism of a sensationalist media that has created false rumors and stories - even a very current film - from flying saucers invading the country to false police information, such as the discovery of the identity of the red light bandit. The director and screenwriter Rogério Sganzerla created a visually and aurally striking; a mix of references and metalanguages. The movie narrates typical events of urban life in which transits the thief interpreted by Paulo Villaça (freely inspired by the crimes of famous bandit João Acácio Pereira da Costa, nicknamed “red light bandit”). This movie is amazing, incredible, creative and innovative. Chaotic in the good sense of the word. Watch, review and understand why it is a true “western about the third world. ” The movie deserves a five stars rating.

O Bandido da Luz Vermelha - Rogério Sganzerla - Brasil - 1968: Um faroeste sobre o 3º Mundo.

 



O Bandido da Luz Vermelha” é um filme espetacular, de 1968, que cativa desde o começo, desde os créditos que na maioria das vezes são enfadonhos. Então, prende a atenção do espectador até o final. O diretor é Rogério Sganzerla e o filme tem como atores principais Paulo Villaça como o “Bandido” e Helena Ignez interpreta a personagem “Jante Jane”, uma prostituta com a qual o bandido se relaciona. Ambos são sólidos em suas atuações. Utilizando locutores de rádio como narradores do filme durante toda a história, esta obra é um drama/thriller que critica a mídia sensacionalista, que criava boatos e histórias falsas -, um filme, inclusive, muito atual -, desde discos voadores invadindo o país a falsas informações policiais, como a da descoberta da identidade do bandido da luz vermelha. O diretor e roteirista Rogério Sganzerla cria um cinema impactante visualmente e auditivamente; uma miscelânea de referências e metalinguagens; narra acontecimentos típicos da vida urbana em que transita o ladrão, vivido por Paulo Villaça (livremente inspirado nos crimes do famoso assaltante João Acácio Pereira da Costa, apelidado de “Bandido da Luz Vermelha”). Uma obra de cinema espetacular, incrível, criativa e inovadora. Caótica na boa acepção da palavra. Vejam e revejam e entendam porque se trata de um verdadeiro “faroeste sobre o terceiro mundo”.