terça-feira, 28 de novembro de 2017

“UM FILME DE SUPER-HEROÍNA NA ESSÊNCIA”:Mulher Maravilha - 2017 (Patty Jenkins)

“UM FILME DE SUPER-HEROÍNA NA ESSÊNCIA”:

Mulher Maravilha -  2017 (Patty Jenkins):




(Por Rafael Vespasiano).

“As adaptações cinematográficas pós-modernas do Universo sempre foram problemáticas ou ao menos com filmes falhos ou irregulares. Breve histórico: a tetralogia original do Superman, todos os filmes irregulares e o quarto péssimo. Mesmo com os excelentes e/ou carismáticos Gene Hackman e Christopher Reeve. A tetralogia original do Batman tem os dois primeiros filmes dirigidos por Tim Burton como salvação, pois o péssimo diretor Joel Schumacher acabou com a série com os filmes seguintes. Vilões e vilãs e atores e atrizes subaproveitados e que detonou no conjunto a série.
Não falarei de séries animadas que já vinham desde a televisão; alguns telefilmes e séries live-action: Adam West é o Cara! Muito menos falarei das séries dos dois tipos e curtas da netflix e etc., pois estas nenhuma vi.

Mulher Maravilha -  2017 (Patty Jenkins, diretora de Monster – Desejo Assassino, quando o/a cineasta é excelente a expectativa é grande por isso também; apesar, por exemplo das decepções causadas pelos ótimos cineastas Ang Lee, em O Incrível Hulk, e, Kenneth Branagh, com o primeiro Thor, ambos filmes do outro Universo Marvel -, porém aí é outro papo, que disseram até que um diretor o primeiro do cinema tipicamente de arte e o outro é shakespeariano.). Mas, e a Jenkins? Conciliou o cinemão, a qualidade fílmica e de roteiro e o cinema de certa reflexão em alguns âmbitos do texto/filme e contexto social/enredo/Humanidade séculos, já vividos até 2017, e o porvir.
A questão, na verdade, é que estamos diante da melhor adaptação da DC desde Batman - O Cavaleiro das Trevas (trilogia maravilhosa de Nolan), uma produção que surge para dar nova vida ao novo universo da companhia, prejudicado pelo péssimo Batman Vs Superman - A Origem Da Justiça e pelo horrível Esquadrão Suicida.
Mulher-Maravilha é o primeiro filme-solo de uma heroína a ganhar as telas desde o tenebroso Elektra, em 2004. Mas naqueles idos as adaptações de HQs num mundo pré-universos Marvel e DC, não eram tão levadas a sério, em especial no que se revela na ligação e continuidade entre filmes de heróis diferentes e a formação de suas super-eguipes.
E se a Marvel foi mais rápida ao reunir seus principais super-heróis em uma só obra, a DC venceu a corrida para lançar o primeiro filme-solo com uma protagonista feminina, mostrando que a concorrência errou ao não se render aos apelos por um longa da Viúva Negra, por exemplo. Oh, agora Inez é morta, Camões.... Ah, não esqueçamos o desastroso Mulher Gato, com Halle Berry e Sharon Stone, um filme com todo tipo de defeitos e até de machismo evidente.
Mulher Maravilha é uma história de origem, mas que não deixa de apresentar sua ligação com o universo da Liga da Justiça ao trazer breves momentos passados nos dias atuais. A maior parte da trama, no entanto, ocorre no passado. Somos logo apresentados a uma pequenina Diana, princesa das Amazonas, que vive numa ilha isolada do mundo. Ela sonha em treinar para se tornar uma brava amazona, mas é proibida pela mãe (Connie Nielsen), que teme em ver a filha em combate. A jovem, entretanto, busca a ajuda da tia (Robin Wright) para completar seu treinamento.
Treinamento que se mostrará bem-vindo quando, anos mais tarde, um avião cai na costa da ilha e Diana (Gal Gadot) é obrigada a socorrer o piloto, o espião britânico Steve Trevor (Chris Pine). Ela consegue retirá-lo do mar, mas logo descobre que ele era parte de um conflito muito maior, que ameaçava todo mundo, a Primeira Guerra Mundial. Tomada pela missão e pela vontade de proteger a humanidade, Diana decide contrariar a mãe e seguir com Steve para o campo de batalha.
Na verdade, há uma celebração do fantástico, principalmente ao investir numa abordagem menos realista, que envolve diretamente um cenário mitológico. A diretora Patty Jenkins preferiu investir num humor natural e privilegiando cenas com boa iluminação. Fotografia é cinema em essência, devemos sempre observar alguns enquadramentos, que por exemplo em Mulher Maravilha são em sua maioria ‘delicados’ e têm um porquê de ser e aparecerem na tela.
“Falando nas cenas de ação, são vários os confrontos. E todos muito empolgantes, principalmente pela postura central de Diana. Em determinado momento, ela é informada por Steve que nenhum homem conseguiria atravessar tal campo de batalha. Um roteiro mais piegas colocaria ela respondendo: “eu sou uma mulher”. Mas o filme não precisa disso. A postura e atitude da personagem fala por si só. ” (Lucas Salgado).
Sempre que uma película tem como viés uma temática de reprensitividade, Mulher-Maravilha tem o foco no protagonismo feminino, mas não só isso. O filme mantém e abrange brevemente a questão da cor da pele, com um personagem que não consegue seguir seu sonho por causa da cor de sua pele. Também trata de sexualidade de forma inovadora para filmes de super-heróis, mais ainda pela inovação e primazia nessas questões para filmes de super-heroínas.
Patty Jenkins, que já havia se destacado em Monster - Desejo Assassino e na série The Killing, cai como uma luva no mundo dos super-herói. O filme funciona como ação, como fantasia, como aventura e até mesmo como romance. Trata de um amor entre pessoas, mas também de um amor altruísta pela humanidade. É de fundamental importância por desenvolver uma protagonista que é forte e determinada, mas também sensível e capaz de amar.
Sempre ponto de divergência na guerra Marvel x DC, o humor está presente no novo longa. E se revela extremamente importante na construção da personagem e de sua relação com Steve. O humor humaniza Diana, reforçando sua inocência de alguém que viveu isolada do mundo e que, agora, vê prazer em pequenas coisas, como num sorvete.
O roteiro inclusive é tão bom, em especial na questão de jamais usar o nome Mulher-Maravilha. Não há momentos de auto ostentação. Diana fala por si só. Nos últimos anos, Jenkins se destacou mais com séries do que no cinema. Aproveitando o bom momento da TV estadunidense, ela se cercou de profissionais de trabalham em séries em WW, como o diretor de fotografia Matthew Jensen, que é um ponto de destaque deste filmão, com boas cenas em todos os sentidos de abordagem e ângulos das câmeras.
“Muita gente vai diminuir algumas questões do filme e, como dito lá no começo, trata-lo apenas como um filme de super-herói. Mas não se engane! Não é coincidência que o primeiro filme de super-heroína dirigido por uma mulher ser também o primeiro a oferecer uma protagonista que não seja mero símbolo sexual. Há uma clara preocupação na mensagem que está sendo transmitida. E, melhor, tal transmissão é bem-sucedida. ” (Lucas Salgado). ”




Link-base:


quinta-feira, 16 de novembro de 2017

O Último Chá do General Yen (Frank Capra, EUA, 1932):

O Último Chá do General Yen (Frank Capra, EUA, 1932):

Por Rafael Vespasiano.




“Frank Capra fugiu de sua típica filmografia ao realizar este filme muito interessante, O Último Chá do General Yen, em 1932. Esta película tem um quê de perversidade, diferente da maioria dos grandes filmes e mais conhecidos de Capra, reconhecidos por sua grande idealização e otimismo.
O Último Chá do General Yen é necessário e indispensável para qualquer cinéfilo para conhecer e entender o início da carreira cinematográfica de Frank Capra. Yen pouco depois de uma série de outros filmes do começo da carreira ajuda a contextualizá-lo melhor e torná-lo menos um objeto estranho na carreira do diretor.
Capra é um diretor que só pode pertencer aos anos 1930, porém, nunca ficou datado com seus filmes (são raríssimas exceções deste fato), Capra é um cineasta clássico e, portanto, universal por excelência.
Yen é o primeiro das grandes figuras que fascinam o diretor, mas sua concepção permanece mais distante e indecifrável de que nos filmes posteriores, muito pela relação estranha que ele mantém pela ideia do outro. Já que General Yen é uma fábula sobre o desejo missionário no qual o orientalismo é menos usado pelo seu fascínio do que para desenvolver um jogo de dualidades dinâmicas entre o fracasso do missionarismo, pois este é inseparável da constatação de que o estrangeiro não é o general oriental, mas a missionária ocidental.
As sequências menos interessantes de O Último Chá do general Yen podem ser aquelas em que reduzem o filme a um jogo ideológico entre Stanwyck e Nils Ashter (ambos extraordinários, e é uma pena que o incômodo da presença politicamente incorreta do dinamarquês Ashter como um general chinês atrapalhe o reconhecimento do trabalho dele aqui), mas elas permanecem graças a concepção geral do filme.

O Último Chá do General Yen é um romance entre etnias diferentes, previsto nos esforços da mulher branca de negar o seu desejo e na capacidade da imagem cinematográfica de desnudá-lo. General Yen é na sua essência um filme de relativa sensualidade sugestiva, que está no seu melhor quando a câmera (um dos melhores trabalhos de Joseph Walker) isola Ashter e Stanwyck no quadro e torna o desejo deles palpável. Yen é um dos raros filmes nos quais a figura objetivada pela câmera é quase sempre o homem. Enfim, o tom sugerido de brutalidade e da perversidade do filme vem do reconhecimento desta ideia. ” 




quinta-feira, 2 de novembro de 2017

A Sétima Cruz (Fred Zinnemann, EUA, 1944)/ Os Filhos de Hitler (Edward Dmytryk, EUA, 1943):

A Sétima Cruz (Fred Zinnemann, EUA, 1944):



Por Rafael Vespasiano.


“Filme hollywoodiano de nítida propaganda antinazista e por ser dirigido por um excelente cineasta, Fred Zinnemann consegue fazer um razoável trabalho de filme anti-guerra, que, contudo, fica mais como um filme de guerra e suspense preso a um bom enredo e nada mais. Enfim, um filme perdido no tempo, e, infelizmente já bastante datado.
Sinopse: Na Alemanha Nazifascista, sete homens que estavam presos em um campo de concentração conseguem fugi do mesmo, a partir de então começa a perseguição implacável da Gestapo para recuperá-los e enterrá-los em covas já preparadas, onde estão as cruzes esperando o sepultamento sem maiores honras militares e ou religiosas...”




Os Filhos de Hitler (Edward Dmytryk, EUA, 1943):



Por Rafael Vespasiano.


“Chocante e marcante filme denúncia contra a Juventude Hitlerista alienada pelas ilusões do Nazi-fascismo do Terceiro Reich liderado por Adolf Hitler. Mais um filme estadunidense antinazista, porém, o trabalho do cineasta Dmytryk é valoroso e merece o registro de ir muito além de um mero filme propagandista e antibélico, vemos dramas de consciência em um enredo reflexivo e que se propõe analisar mais a fundo a perspectiva ideológica do nazismo, em especial, da Juventude Hitlerista. Por isso tudo, este filme não é tão datado quanto o dirigido por Fred Zinnemann. Merece ser visto com mais afinco e atenção. ”


quarta-feira, 1 de novembro de 2017

Ama-me Esta Noite (Rouben Mamoulian, EUA, 1932):

Ama-me Esta Noite (Rouben Mamoulian, EUA, 1932):

Por Rafael Vespasiano.




Ama-me Esta Noite é para muitos críticos de cinema o primeiro grande musical produzido em Hollywood e, se for assim, pode-se dizer que o mérito é, em grande parte, do cineasta Rouben Mamoulian que conduz o enredo açucarado de forma brilhante e faz o filme não cair no tédio em nenhum momento, pelo contrário o filme continua relevante até os dias atuais, por suas inovações técnicas e narrativas; de fato é um clássico hollywoodiano e do cinema em todos os tempos.

A trama é bem simples e previsível, basicamente se resume ao amor vencendo a barreira das classes sociais, contudo o enredo é construído de maneira contagiante, com muita energia e humor que simplesmente não há como não se envolver. Todos os números musicais agradam, com destaques para o começo do filme, em que os sons naturais do dia a dia transformam-se em música e a antológica sequência de “Isn’t it Romantic? “, nesta sequência inesquecível, a canção percorre uma longa distância sendo cantada por várias pessoas, até chegar aos ouvidos da princesa Jeanette, um grande trabalho de Mamoulian na condução da cena em termos de edição, de som e de câmera. Em uma época em que o som no cinema havia acabado de se consolidar, o diretor Rouben Mamoulian demonstrou um grande conhecimento do formato e realizou um trabalho que jamais será esquecido. ” 



terça-feira, 31 de outubro de 2017

O Médico e o Monstro (Rouben Mamoulian, EUA, 1931):

O Médico e o Monstro (Rouben Mamoulian, EUA, 1931):


Por Rafael Vespasiano.





“O cientista Henry Jekyll, fascinado pela dualidade dinâmica e irônica-dramática entre o bem e o mal, desenvolve um produto químico que o transforma em um perigoso assassino, que passa a ser conhecido como Sr. Hyde, revelando o lado sombrio que se esconde dentro dele. Dirigido soberbamente por Rouben Mamoulian, esta história que é baseada no romance de Robert Louis Stevenson, o cineasta faz uso de ângulos e câmeras subjetivas de uma forma inovadora e magistral.
No mesmo ano foram lançados “Frankenstein”, “Drácula” e “O Médico e o Monstro”, entrando para a lista dos primeiros grandes filmes de terror. Terror este que vem com toda uma temática de drama associada, em específico o drama de consci~enciaa das personagens protagonistas marcadas sempre por uma dualidade dinâmica irônica e reflexiva. Servindo como um palco para discutir questões humanas e existenciais. Para uma época onde o som praticamente acabava de surgir no cinema e não existiam recursos suficientes para grandes efeitos especiais, este filme conduzido por Mamoulian surpreende.
Observamos os efeitos durante as mudanças físicas da personagem principal, que se transforma num mostro bizarro, assim como a mudança de comportamento deste, que ganha destaque na grande interpretação do ator Fredric March, que acabou levando o Oscar de Melhor ator, dividindo o prêmio com Wallace Beery (“O Campeão”) por conta da diferença de apenas um voto (na época isto era considerado um empate na categoria). Complementando, temos a ótima fotografia de Karl Struss, na produção de Adolph Zukor (que também foi o produtor da versão anterior, de 1920) e, por fim, um diretor respeitado e ousado, Rouben Mamoulian, adaptando para as telas um grande clássico sobre a dualidade da alma humana, escrito por Robert Louis Stevenson: “The Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde”, publicado em 1886.
O resultado, considerado bem fiel à proposta da obra escrita, discute a existência do bem e do mal dentro de cada pessoa de forma indissociável, às vezes conciliadoras entre aquelas forças, outras vezes as forças do bem e do mal não conseguem se manter controladas, e uma se sobressai sobre a outra, o que é normal para qualquer ser humano.
A transformação da personalidade fica bem representada nas mudanças da voz, na expressão corporal (com direto a um pouco de acrobacias), nos gritos, violência e falta de polidez e educação com os outros, contradizendo exageradamente com o Dr Jekyll, sempre gentil, bondoso e cuidadoso com as pessoas. Com grandes enquadramentos e movimentos de câmera, ficou fácil contemplar o filme. Logo no início podemos perceber a originalidade no uso da técnica de mostrar a visão da perspectiva do médico. Em outros momentos, a exibição de 2 cenas ao mesmo tempo – com a tela dividida – também se tratou de uma das primeiras inovações do tipo.

Somente no final da década de 60 o diretor revelou como os efeitos foram produzidos. Ao que parece, a equipe de maquiagem da Paramount construiu uma prótese para o personagem do Sr. Hyde, e os efeitos para a transformação usavam manipulação de uma série de filtros de cores na frente da lente da câmera. Durante a primeira cena da transformação, os ruídos que acompanham a trilha sonora incluem um sino soando ao fundo e supostamente uma gravação com a batida do coração do diretor Rouben Mamoulian. Incrível e original. Uma obra-prima. ”  






quinta-feira, 19 de outubro de 2017

“A MARCA DO ZORRO”, EUA, 1940, de Rouben Mamoulian:

(Por Rafael Vespasiano):



“No início do século XIX, em seu retorno à Califórnia, após uma temporada na Europa, Dom Diego (Tyrone Power) encontra seu povo sob o domínio dos espanhóis. Filho único de Dom Alejandro Vega, rico proprietário da região, fingia ser um fidalgo covarde para poder agir como Zorro, um justiceiro, o Robin Hood latino.  Dotado de muita paciência, montava antes todo o esquema de ação e partia sempre com a certeza de sucesso ao final da jornada e das batalhas. E seus esplêndidos duelos de espada brilhantemente filmados e conduzidos pela direção de Rouben Mamoulian.
"A Marca do Zorro" é um ótimo filme de aventuras de capa-e-espada, gênero muito popular na primeira metade do século XX nos Estados Unidos da América.   Realizado em 1940 por Rouben Mamoulian, o filme começa com um bom ritmo, o qual é mantido até o final, quando ocorre um dos maiores duelos já vistos, no cinema, entre dois dos mais ágeis espadachins de Hollywood, Tyrone Power e Basil Rathbone. Obra-prima do subgênero capa-e-espada.

Além da excelente direção de Mamoulian, "A Marca do Zorro" conduz o espectador pelas aventuras do heroi, com uma brilhante trilha sonora, assinada por Alfred Newman, uma bela fotografia em preto-e-branco, uma boa direção de arte e ótimas atuações de seus principais atores.  Além de sua magnífica interpretação Tyrone Power consegue criar uma ótima química com a atriz Linda Darnell. ”



terça-feira, 17 de outubro de 2017

Rainha Cristina, 1933, de Rouben Mamoulian, EUA

(Rainha Cristina, 1933, de Rouben Mamoulian, EUA):

(Por Rafael Vespasiano).




Rainha Cristina é dirigido magistralmente tecnicamente e com excelente direção de atores pelo cineasta Rouben Mamoulian. Um filme estrelado pela magistral Greta Garbo, que se cansara de desempenhar a eterna tentadora, de vida dissoluta, que acabava por sofrer fins inenarráveis, depois de ter destroçado vidas à sua volta. Por outro conseguia finalmente ser centro de um conjunto de filmes de enormes valores de produção, inspirados em personagens históricas de maior complexidade e empatia com o seu público. Por fim, para este filme, Garbo conseguia o regresso de John Gilbert, cuja carreira definhava com o advento do sonoro. Todos estes elementos se conjugavam na reinterpretação da história dos amores da Rainha Cristina da Suécia, afinal o país de onde Garbo era proveniente. A atriz lera a história de Salka Viertel, quando estava de férias na Suécia e decidiu que era hora de trazer uma sua conterrânea para o cinema.
Rainha Cristina conta a história daquela que foi rainha da Suécia em meados do século XVII, numa época em que o reino era um dos mais poderosos do norte da Europa, vitorioso na Guerra dos Trinta Anos, e defensor ardente do protestantismo. Cristina (Greta Garbo) surge representada tal como era, mulher independente, de personalidade forte, amada do seu povo, com forte sentido de estado e uma grande paixão pelo conhecimento e cultura, quer científicos quer artísticos, numa atuação exemplar e contundente artisticamente realizada por Garbo e conduzida pelo diretor do filme Mamoulian.
É essa a trama da história do filme de Rouben Mamoulian (um cineasta célebre e reconhecido pela versão da Paramount da história O Médico e O Monstro, de 1931, uma das melhores versões para a telona do romance de Stevenson), que coloca a ênfase do filme nas pressões para a necessidade de casamento, como forma de garantir herdeiros para a coroa. Os ‘caprichos’ da rainha ganham proporções de assuntos de estado, quando a rainha se apaixona pelo embaixador de Espanha, Don Antonio (John Gilbert), e com isso começa a ganhar a oposição de todo o reino. Resta-lhe apenas decidir entre casar com Charles e esquecer o seu amor, ou deixar o reino por Don Antonio.

Temos assim Greta Garbo em mais uma história de amor, mas agora como uma mulher de honra, disposta a trocar um reino pelo homem que ama. É, como sempre, uma personagem dominante, mesmo nas relações amorosas. O filme termina com uma grande sequência de ‘aventura’, onde não falta um duelo final, mas mais que o destino dos homens, é o destino da rainha que nos interessa. Faltando aqui o fato de Cristina ter fugido para Itália onde se converteria ao Catolicismo, isso é deixado em aberto, para vermos apenas uma mulher resoluta, que não se quer deixar amarrar a convenções, senhora do seu destino, como o ilustrado na cena final, o grande plano famoso em que vemos Garbo orgulhosa, na proa do seu navio. ” 



sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Gauguin: Post 3 de 4: A Bretanha e as relações artísticas entre Gauguin e Van Gogh.



Gauguin: Post 3 de 4: A Bretanha e as relações artísticas entre Gauguin e Van Gogh:

                                                                (Por Rafael Vespasiano).

No próximo e terceiro post, abordaremos mais da fase bretã; a relação Gauguin e Van Gogh. Para o último post, abordaremos o tríptico do Cristo Amarelo; os retratos e autorretratos; as obras primas da fase da Polinésia Francesa; o painel De onde viemos? Quem somos Nós? Para Onde Estamos Indo?.;  a fase final de Gauguin, sua decadência e últimos autorretratos; as influências que Gauguin sofreu e a quem ele influenciou nas Artes; este último tópico mais a passant, porém com referências teóricas sempre, para embasar todos os quatro posts do projeto sobre Gauguin.
Gauguin ao sair de Paris fugindo da burguesia que o oprimia de maneira muito particular, como já abordamos anteriormente, em especial, no primeiro post, procura um lugar para testar suas ideias na questão das artes ‘ancestrais’, no caso de suas próprias origens e de maneira mais abrangente as origens misteriosas do Cosmos. O artista viveu duas temporadas na Bretanha, neste intervalo, conheceu a Martinica, no Caribe, que ocorreu entre a primeira temporada na Bretanha em 1886 e a segunda que se deu em 1888. Pesquisando e estudando desenvolveu uma extensa cultura artística e teórica sobre o simbolismo dos ancestrais ritos bretões e a simples mas sublime esculturas oceânicas. A busca verdadeira é a natureza humana não afetada por uma suposta ‘civilização’ pois esta comunidade ‘originária’ estar justamente na acidentada costa da Bretanha, em suas vilas supostamente ‘exóticas’.
Mas como representar a realidade que se apresenta para Gauguin diferente dos impressionistas, que o artista repudia, ou seja não desejava o artista moderno não copiar fielmente a natureza de acordo com suas ‘impressões’ do real, ele decidiu-se preocupar mais com a criação do que com o resultado primoroso em termos técnicos formais.
Entre fevereiro e outubro de 1888, na segunda temporada na Bretanha, Gauguin colhe enfim os resultados aprendidos com as tradições técnicas de Pissarro, (pinceladas fortes), a simplicidade formal de Cézanne, a disposição pictórica incomum de Degas, e, de novo a originalidade decorativa do Japão, mais o contato com as cerâmicas e as lembranças do Peru e as viagens itinerantes pelos mares do Caribe.
  Quem contribuiu ainda para a formação de sua técnica ‘bretã’ foi o artista e intelectual Emile Bernard, este pensava a pintura como uma questão de ideias e conceitos, que superasse o naturalismo realista do Impressionismo. Destas reflexões conjuntas surgiu uma obra ímpar de Gauguin:

VISÃO APÓS O SERMÃO (JACÓ EM LUTA COM O ANJO). 1888. Óleo sobre tela.
National Gallery off Scotland, Edimburgo, Escócia.

 

A pintura representa simbolicamente e sugestivamente uma realidade dual entre veracidade e devaneio, fé e ceticismo. Este cenário de complexidade visual e ideológica de uma cena sagrada, na qual o próprio Gauguin afirma que é um grupo de bretões rezando vestidos de negro, o que reforça a intensidade dramática da obra. As toucas brancas, à direita, se assemelham a dois capacetes disformes;  o galho da macieira púrpura atravessa o quadro, com sua folhagem desenhada como nuvens verde-esmeralda; o solo é vermelho de uma intensidade ímpar e pura.
Toda esta composição visual e cromática reforça a intensidade dramática do conflito entre o sagrado e o profano, que não tem fim, continua em devir na tela e na observação do espectador, e, de uma maneira geral no Cosmos indefinadamente. Gauguin consegue realizar uma obra pictórica universal que aborda a dualidade dinâmica entre o divino e o diabólico.
Jacó luta contra o Anjo, aquele está vestido de verde-garrafa, e o Anjo de azul. A pintura fragmentada, faz o espectador seguir a visão dos bretões em direção à cena dramática da luta entre o Anjo e Jacó. A curva da macieira delimita o real da cena, da luta sagrada, mas ao mesmo tempo profana entre o Anjo e Jacó, na sugestão pictórica de Gauguin, este duelo torna-se ao mesmo tempo também real-devaneante. Uma visão do homem campesino com os olhos fechados em oração, depois de ouvir o sermão sobre a passagem do Gênesis.
As referências do pintor francês foram os lutadores de Hokusai e vitraiss medievos, a Luta de Jacó com um Anjo, de Delacroix, e a Martinica na escolha das cores saturadas e brilhantes.

LUTA DE JACÓ COM UM ANJO. 1850-1861. Delacroix. Óleo e cera sobre parede.
Igreja de Saint-Sulpice, Paris.

 
   





A paisagem agreste da costa da Bretanha e do interior foi pesquisada e esmiuçada por Gauguin durante os meses que passou em Pont-Aven. O contato direto com a natureza não o leva ao retrato fidedigno das paisagens ao ar livre, o antinaturalismo é que se sobressai. Assim o desequilíbrio da natureza e a asperza da Bretanha faz Gauguin carregar nas cores de tons estridentes e acentando o assimétrico e os conflitos duais da dinâmica do Cosmos e da natureza. É isso que se percebe em:

PAISAGEM EM PONT-AVEN. 1888. Óleo sobre tela.
Coleção Privada.






 Detalhe para as figuras das duas bretãs camponesas que parecem afundar em um poço porque estão muito próximas do espectador.



Gauguin é um artista errante e que pesqusia seu ofício como poucos pintores, em suas viagens e estudos, foi de Pont-Aven a Arles, de Arles de novo a Pont-Aven e Le Pouldu, neste interim passsaram-se dois anos, de observações e pesquisas. A síntese foi aos poucos progressiva a respeito de uma natureza que resulta em formas geométricas, ambientes redzidos a cromatismo simplificado. A composição ganha ritmo sugestivo de aabstrações de linhas e cores unidas e bastante saturadas. É o que percebemos no óleo sobre tela As Lavadeiras de Arles, de 1888. Estas lavadeiras arlesianas se assemelham na cosmogonia de Gaugui às camponesas bretãs.

AS LAVADEIRAS DE ARLES.  1888. Óleo sobre tela.
Museu de Arte Moderna, Nova York.




O artista observa a cena e o espectador também sob vários pontos de vista: do alto, do centro, do nível da grama. Quatro figuras reclinadas a lavar roupa no riacho, o que leva o o observador a perceber no canto direito do quadro as forrmas redondas das mulheres reclinadas e de diferentes cores em perfeita sintonia e harmonia.
A figura em pé teum um tom em escultural, de tão rígida e impostada, mais os rostos de duas outras mulheres cortados na borda inferior da pintura. Outro ponto de vista é o lado direito, a outra ponta do rio, habitado apenas por campos, árvores e uma cabana, o que sugere um sentido de desorientação aos observadores da pintura, uma pintura áspera  e com a cor verde variando em diversas tonalidades: de malva para verdde-musgo, de ocre para esmeralda; mais escura e definida é a margem do rio que lança uma sombra densa na água. Uma sombra que se torna de uma solidez sugestiva e estilizada e antecipou as simplificações que a escola de Pont-Aven transformaria em suas características entre pintores, artistas e obras do movimento, do qual Gauguin, lógico, é o mestre.

Gauguin passou, como dito nos posts anteriores, dois meses em Arles, em companhia de Van Gogh em trabalhos artísticos, pesquisas sobre Artes e afins, pintura de telas, debates sobre vários assuntos e uma amizade atribulada entre dois gênios super-ativos e combativos e bastante geniosos e de ego inflamados o que leva-os às vezes baterem de frente.
Mas criativamente tamém foi bastante profícua a parceria, como percebe-se na tela de Gauguin, Café em Arles à Noite (Madame Ginoux), novembro de 1888. Gauguin logo começou a trabalhar quando chegou em Arles em temas já pintados por Van Gogh. Cada pintura revela e desvela a profunda diferença entre a visão e as pinceladas dos artistas, ao interpretarem a realidade de uma forma radicalmente diversa.
O café dirigido por madame Ginoux, à noite, na Place Lamartine, em Arles, é retratado por Van Gogh, em três sessões noturnas, que revelam um ambiente alucinado e visionário, feitas sob um ponto de vista elevado, em que o marelo predomina quase a deslumbrar o espectador. Dois meses depois, gauguin elabora uma composição mais sóbria, aproximada e em tons vermelhos.
Duas visões da mesma cena e situação, alteerações da realidade, pois nenhuma delas se propõe a ser fiel em strictu sensu a realidade observada pelos dois artistas. O café de madame Ginoux tornou-se um tipo de estudo para os ideais artísticos dos dois pintores, Gauguin e Van Gogh.
Vejamos as diferenças entre as obras dos supracitados artistas plásticos:

CAFÉ EM ARLES À NOITE (MADAME GINOUX): novembro de 1888. Óleo sobre tela.
Museu Pushkin, Moscou.




Uma obra mais sintética e econômica que a de Van Gogh, os campos de cromatismo estão perfeitamente separados, as paredes são vermelhas, a mesa de sinuca é verde, Madame Ginoux está de preto e branco, o sifão, de mármore branco, é azul. Cada pessoa é simplificada e antes de ser uma personagem, ou objeto, é uma forma colorida.

CAFÉ À NOITE  NA PRALA LAMARTINE EM ARLES. Setembro de 1888. Óleo sobre tela. Van Gogh.
Yale University Art Gallery, New Haven, EUA.




Van Gogh ofere uma visão diferente e oposta: ele utilizou o vermelho como tentativa de explicar as paixões humanas; o ambiente/espaço é vermelhho-sangue e amarelo; no meio há o verde da mesa de bilhar e as lâmpadas amarelo-limão, a irradiar e sugerir uma luz laranja e verde; há uma constante luta cromática na tela entre verdes e vermelhos diferentes, nas peqquenas personagens sonolentas, na sala vazia e melancólica, há também o conflito entre o roxo e o azul.
Gauguin e Van Gogh utilizam ambos uma perspectiva incomum e realizam uma pintura resumida, não descritiva, mas sugestiva; a distinção entre as telas se dá na cor e na característica das pinceladas.

Para se perceber o vai-e-vem nas brigas e harmonias na amizade e relação artística entre os dois pintores, Van Gogh pinta este óleo sobre tela que retrata a Madame Ginoux, das pinturas do café em Arles, na praça Lamartine:

A ARLESIANA (POR PAUL GAUGUIN). Van Gogh. 1890. Óleo sobre tela.
Galleria d´Arte Moderna e Contemporanea, Roma.



Harmonias e desarmonias na convivência entre dois gênios, tanto no pessoal quanto no artístico, por fim, para fecharmos esta questão da vida artística/pessoal experenciada em Arles, entre Van Gogh e Gauguin, vejamos os trabalhos, onde os dois artistas estão mais dispostos a experimentar o procedimento do outro, num trabablho de influências e re-invenções artísticas e plásticas, na busca de afirmar o próprio estilo.  
Enquanto Van Gogh trata cromaticamente os seus trabalhos com estímulos de inspirações românticas, extraídas diretamente da obsevação da natureza. Gauguin reivindicava os seus próprios métodos, a saber: tratamento cromático mais linear e articulado, à Cézanne, e a construção com maior equilíbrio entre formas e espaços, numa proposta visual alternativa para Provença como já verificarmos em alguns trabalhos mais acima e nos posts anteriores neste blog.
Percebe-se o exposto no parágrafo anterior na pintura Les Alyscamps (1888), um dos primeiros quadros da fase de Arles, eles têm fortemente as tradições das pinceladas de Cézanne. São avenidas formdas por ciprestes e alguns túmulos vazios, por onde caminham, no canal formado, três figuras. Essa é uma visão bem serena e calma, contrasta com as versões tormentosas e contemporâneas de Van Gogh. Se no uso das cores Gauguin resistia em reconhecer a influência do amigo, em pinturas cujo tema era a miséria humana, ele admitiu a influência involuntária que o guiou em sua fase bretã e na Polinésia, com alegorias e metáforas que expressaram a paritr de então o simbolismo sugestivo de Gauguin.



Les Alyscamps. Óleo sobre tela. 1888:
Coleção Particular.









Les Alyscamps. Óleo sobre tela. Van Gogh. Novembro de 1888:
Coleção Particular.





Gauguin volta à Bretanha no verão de 1889, e inspirado pelas paisagens belíssimas, os costumes tradicionais e as pessoas que o havaiam atraído em visitas anteriores, Gauguin sempre afirmou que para fazer o novo deve-se voltar às origens  e à infância da Humandidade. Por isso  repele a Paris cosmopolita e impressionista  ocidental, para realizar uma busca artística nas raízes dos cultos bretões, expressoas nas esculturas românicas e góticas, nos vitrais e nas gravuras populares.
Em Le Pouldu, neste período nasce o quadro Meninas em Frente ao Mar:


Meninas em Frente ao Mar. Óleo sobre tela. 1889:
Museu de Arte Ocidental, Tóquio, Japão.





Vê-se duas crianças muito esculturais, simples e sintéticas nas pinceladas e com as cabeças um tanto deformadas: as cabeças, as mãos e os pés são muito em relação aos corpos, que parecem esculpidos em madeira, rígidos e mecânicos. Dando-lhes, às figuras proporções monumentais em comparação com a colina, que se torna apenas um fundo da visão simbólica-sugestiva. As meninas longe da tradição de imagens simplesmente pueris, tornam-se gigantes, verdadeiros engimas fechadas em seus rostos de aparente hostilidade, mas também de afabilidade, se pernsarmos que estarmos tratados de questões da infância da Humanidade, numa dualidade dinâmica entre pureza e impureza do Cosmos.



Flautista sobra a Falésia. Óleo sobre tela. 1889:
Indianapolis Museum of Art, Indianápolis, EUA.





Neste mundo, em que aparentemente sendo excluídas as duas figuras centrais da tela -, o flautista e a mulher -, a imaagem seria totalmente abstrata, mas o brilhantismo de Gauguin realiza uma obra em linhas alternadas e de direções diferentes, mesmo que a força da cor seja poderosa a ponto de anular o efeito de separação dos planos. Contudo, o morro, neste mundo pictórico-sugestivo, pode ter tons de verde, laranja, rosa, prata, roxo. O artista realiza uma obra ousada, pois leva o espectador a percorrer o ‘mundo’ do alto da tela, acima do Abismo, até um lugar fora da tela. O flautista é uma referência sugestiva à figura de Paul Cézanne. Mais um tom de brilhantismo desta obra-prima de Gauguin.

REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS:

MAZZANTI, Anna e PRINCI, Eliana. Grandes Mestres: Pintores, vol. 8. Tradução de Mônica Esmanhotto e Simone Esmanhotto. São Paulo: Abril, 2011.