“O
Bebê Santo de Mâcon é mais uma extravagância fílmica de Peter Greenaway. Mas
como sempre o cineasta britânico nos tem muito a mostrar, seja no âmbito
estético, seja no âmbito temático.
No
que tange ao primeiro quesito, o filme é deslumbrante em suas cores berrantes,
em especial, o uso do vermelho, que na paleta do diretor de fotografia Sacha
Vierny, significa justamente a aberração que é a sociedade retratada na obra.
Além de uma direção primorosa a conduzir o espectador pelos suntuosos cenários
(assinados por Bavo Defurne), que são aproveitados com
maestria por Greenaway, para nos apresentar a história, de maneira teatral: até
parece que estamos dentro de um teatro, aparentemente apenas, pois algumas
cenas foram filmadas na Igreja Velha de Amsterdã e outras em estúdio; e tem-se até
direito a uma “plateia” a presenciar as ações das personagens principais,
aquela plateia devidamente caracterizada por um figurino rico e deslumbrante,
assim como o de todas as personagens, figurino assinado por Ellen Lens e Dien
van Straalen .
Algumas
personagens possuem falas que expressam a consciência de ‘ilusão de realidade’
e, portanto, de ‘ilusão ficcional’, assim sendo tem-se uma espécie de ‘metafilme’,
ou ‘meta-teatro-cinema’. O que é ressaltado pelas vidas humanas (personagens) vividas
como que em uma espécie de ‘teatro de ilusões’, e também pelas ‘máscaras sociais’,
que marcam toda a sociedade e, portanto, toda a humanidade, no desenrolar
infinito dos tempos. Ainda no aspecto técnico, o filme conta com uma excelente
edição assinada por Chris Wyatt, que nos ajuda a compreender melhor as questões
suscitadas pelo roteiro.
No
que se refere ao segundo aspecto, que é justamente a questão temática, tem-se o
roteiro assinado pelo próprio cineasta, que parte de uma premissa básica e que
em outras mãos se tornaria um lugar-comum: a corrupção de toda uma sociedade. Tem-se
de partida, um prólogo ditado pela ‘Fome’, que já nos alerta para o que filme
mostrará em 2h de duração e em três atos, e mais um epílogo-circular, que se
liga ao já narrado no prólogo pela mesma ‘Fome’: uma sociedade corrompida em
todos os seus segmentos, nobreza, clero e plebe.
Uma
sociedade marcada pela miséria, aberrações, enfermidades e iniquidades de todos
os tipos. Uma terra marcada pela esterilidade e pela infertilidade não em produzir
novos seres\rebentos, mas em gerar seres não corruptos e\ou corrompidos. Parte
de supostos milagres perpetrados por um bebê santo, filho de uma virgem, porém
tudo logo é percebido e verificado como uma grande farsa, que leva a mais e
mais tragédias, demonstrando a corrupção do homem e da sociedade, que não é
evidenciada pelo ‘é’, contudo, pelo ‘sendo’, ou melhor seria pelo ‘é’ e pelo ‘sendo’
ao mesmo tempo, a eterna dualidade dinâmica em devir. ”
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