(MACHADO DE ASSIS: O ESCRITOR-MESTRE DO
SÉCULO XIX NO BRASIL):
(“DESCONSTRUÇÃO DAS DUAS FASES MACHADIANAS, ROMÂNTICA E REALISTA: TRATA-SE SIM DE EVOLUÇÃO
ESTÉTICA NATURAL”)
POR:
Rafael Vespasiano Ferreira de Lima
“Machado
de Assis estreou no gênero romance, no ano de 1872, com a obra Ressurreição. Tradicionalmente,
classificado como “romântico”, é, porém, um equívoco tal classificação, pois,
como afirma o Professor Maurício Izolan “Ressurreição é uma verdadeira obra-de-arte
por seu caráter controverso e, em sua aparente simplicidade, complexo”.[1]
Por
isso, somando-se a marca irônica e “a autoconsciência do narrador e o jogo
dramático de vozes que leva à participação do leitor”[2], é discutível falar em uma
“fase romântica” machadeana, visto que seus primeiros quatro romances, além do
já citado Ressurreição, vieram em
seguida: A mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878), são caracterizados por uma estrutura irônica e
por uma polifonia, que são atípicas do romance romântico.
O
que pode-se afirmar é, em uma primeira fase, a fase de amadurecimento para uma
segunda fase, iniciada em 1881, com Memórias
Póstumas de Brás Cubas, na qual Machado de Assis passa a ter pleno domínio
da técnica irônica. Uma ironia refinada e reflexiva, que já se notara nos
primeiros romances, mas, por ainda serem narrados em terceira pessoa, só foi
desenvolver-se, plenamente, a partir de Memórias
Póstumas, narrado em primeira pessoa, pelo defunto autor, invenção ficcional machadeana, que denota sua
genialidade.
Mas,
essa ironia encontra-se já, por exemplo, em seu segundo romance, A mão e a luva, em uma personagem como
Guiomar, que “escolhe” seu esposo, em conformidade com suas ambições e
interesses, opta, então, por um pretendente que lhe “sirva” como uma “luva”.
Assim, o casamento não é visto pelo diapasão romântico, muito pelo contrário, o
Romantismo, nesse caso, é desconstruído, pela ironia e pelo jogo de vozes
também presente na obra.
Pelo
exposto, percebe-se que Machado não teve uma “fase romântica”, mas um amadurecimento de sua técnica narrativa
e literária. Helena, para corroborar
o afirmado até agora, é o terceiro romance de Machado de Assis, uma obra
tragicômica, marcada por uma ironia na construção das personagens. Helena, que apesar
de saber da sua real condição, segue com a farsa; e, ainda tem, no romance, a
personagem do Dr. Camargo, grande beneficiado com o final trágico do romance,
desfecho sem o famoso “final feliz” típico do romance romântico, muito pelo
contrário, nessa obra, tem-se um final tragicômico, irônico.
Iaiá Garcia, quarto
romance, de sua fase inicial, é uma obra ímpar, que já aponta para o
amadurecimento da técnica irônica de narrar e para o jogo polifônico narrativo.
No romance, a ironia, segundo o Professor Maurício Izolan, em Tese de Doutorado
já citada, ela é utilizada como forma de desmascaramento social. As
ambiguidades do romance servem para mostrar que a sociedade é regida pelos
interesses e, assim, “a ironia como questionamento ideológico é a revelação do
traço mais grotesco do jogo social”[3]. O termo grotesco está sendo usado no sentido de
“jogo de interesses” e de “mascaramento social”.
Assim,
pelo exposto, é possível discordar da tradicional classificação, pela qual a
obra machadeana passa, qual seja, uma primeira fase, “romântica”, uma segunda
fase, “realista”. Pois, desde seu primeiro romance, já se faz perceber o jogo
de vozes narrativas e, pincipalmente, a ironia como recurso para a reflexão
sobre a sociedade, sobre os meandros e os interesses sociais e sobre as
máscaras urdidas nas relações sociais.
Vale
ainda ressaltar as digressões do narrador (implícito), em diálogo ou comentando
as ações e falas das personagens e, a alternância das vozes narrativas, pela
qual percebe-se o autor implícito, cujo uso será amadurecido a partir de Memórias Póstumas.
Conclui-se,
pelo afirmado, que a ironia e a polifonia narrativa são marcas típicas da
narrativa de Machado de Assis e, por isso tudo não se pode falar em “fase
romântica”, nem em “fase realista”, porém, pode-se afirmar que Machado possui
uma “fase de amadurecimento”, a que compreende os quatro primeiros romances e,
possui uma outra fase, a fase de total domínio da técnica narrativa, que vai de
Memórias Póstumas de Brás Cubas a Memorial de Aires. Machado de Assis,
enfim, desconstruiu e parodiou o Romantismo e, ironizou o Realismo.”
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