domingo, 26 de outubro de 2014

Moby Dick, Herman Melville: (a vingança obsessiva).

Moby Dick, Herman Melville

(a vingança obsessiva)

(resenha por Rafael Vespasiano)

“Moby Dick publicado, em 1851, e, que foi escrito pelo norte-americano Herman Melville, é um romance detalhista que tem como objetivo declarado pelo “autor implícito”, - este se apresenta na figura do narrador-testemunha Ismael, - o de narrar e descrever a pesca baleeira realizada pelos estadunidenses durante o século XIX.

O descrever em excesso pelo narrador faz que o romance tenha certa lentidão e repetição de informações. Levando-o a parecer muito com os romances naturalistas-científicos do século XIX, à maneira de Zola, o escritor francês de Germinal.

Contudo, o romance de Melville tem um quê de Romantismo atrasado, isso porque se trata de uma narrativa de aventura marítima, com tons místicos e exóticos, típicos do Romantismo de capa-e-espada, só que no caso de Melville transpostos para o mar e para a caça às baleias. O romance tem um tom também de pessimismo, pois a obra esboça desde o princípio do narrar e do descrever os primeiros momentos da personagem principal, Capitão Ahab, um destino final da mesma, que já se prefigura e se mostra fardado ao trágico.

 Segundo Otto Maria Carpeaux, Herman Melville “tinha escrito alguns bons romances da vida marítima, (...), para cair depois em esquecimento completo (...)” (CARPEAUX, 2011, p. 1895). Ainda de acordo com Carpeaux:

Por volta de 1920, (...), redescobriram Melville. Conservaram-se-lhe sempre fiéis alguns leitores românticos, gostando da sua obra como documento do tempo em que os veleiros americanos navegavam pelo Pacífico, antes de a guerra civil acabar com a marinha mercante dos Estados Unidos. Agora se descobriu nesse romântico ‘atrasado’ um grande poeta épico e nas aventuras do capitão Ahab contra a baleia, em Moby Dick, a epopeia do espírito de aventura americano. (Ibid., p. 1895).

Talvez hoje, século XXI, sua obra seja anacrônica e politicamente incorreta, visto a forte tendência à extinção das baleias, promovida justamente pela caça predatória dos séculos XVIII e XIX e, que continua ainda hoje por certos países como o Japão. Tal fato é constantemente denunciado em documentários e reportagens. Sem contar a luta de diversas ONG´s contra esse tipo de caça; e, inclusive, hoje se recrimina muito até os parques aquáticos onde as baleias se apresentam como artistas, mas porquê se descobriram os maus-tratos a que elas são submetidas.

No romance temos detalhes naturalistas da caça baleeira de então. Já nas figuras exóticas dos arpoadores Dagu, Tashtego e Quiqueg, defrontamos com o que por outro lado remete a um romantismo, como afirmou Carpeaux “atrasado.”. Os imediatos Strubb e Flashk são figuras tragicômicas. E o primeiro imediato Starbuck é o único que desafia a autoridade do capitão Ahab.

Ahab está em busca de vingança contra a baleia branca Moby Dick, que lhe arrancara a perna em outra viagem baleeira. O capitão do navio Pequod promove uma nova viagem de caça baleeira, pelo menos a priori, aparentemente, para os sócios donos do veleiro e para a tripulação; - só já distante da costa em pleno oceano, o Capitão Ahab revela o verdadeiro objetivo da viagem, que não se trata de uma simples caça baleeira, mas de uma vingança mortal.

Carpeaux assevera que o escritor Melville é um revoltoso contra “o calvinismo novo-inglês (...).” (Ibid., p. 1896). E que em várias passagens de suas obras encontram-se “numerosas alusões nos seus romances demonstram a sua curiosidade e vastos conhecimentos filosóficos e literários, sobretudo da literatura elisabetana e da romântica.” (Ibid., p. 1896).

O crítico Otto Maria Carpeaux afirma que o estilo de Herman Melville é marcado pela “veemência lírica”. E assevera que “Moby Dick, [é uma] obra antivitoriana porque a vitória cabe, no desfecho, ao espírito do Mal. O romantismo de Melville, (...), não é, porém, autêntico (...)” (Ibid., p. 1896).

As pretensões de Herman Melville são “grandiosas” e “também foi desmesurado seu sucesso póstumo, devido, em parte considerável, (...), ao desejo dos norte-americanos de possuir um grande poeta épico.” (Ibid., p. 1896).

Porém, suas intenções, na maioria das vezes, ficavam atrás das realizações propriamente ditas, “menos, talvez, nas novelas curtas e em Billy Budd, baseado em experiência trágica.” (Ibid., p. 1896). Sua documentação é “quase de um naturalista; Moby Dick é um manual da pesca das baleias. Isso o aproxima de Zola (...)” (Ibid., p. 1896). Melville, também “era um romântico ao quais as circunstâncias exteriores e interiores impuseram o realismo” (Ibid., p. 1896).

Ou seja, que se ressalte o escritor norte-americano é marcado por um “realismo-científico”, nos termos de Jakobson, portanto, um autor naturalista, pois se preocupa em classificar e dissecar as baleias e as suas diversas espécies. Toda essa descrição notadamente naturalista. Mas, também um “romântico atrasado”, pelo exotismo de certas personagens e pelo tom aventuresco da obra.

Também é importante notar o tom bíblico que marca a obra, referências ao profeta Jonas, segundo a Bíblia, aquele fora engolido e regurgitado por uma baleia; tem-se a presença de uma personagem no início da obra de nome Elias (um dos profetas bíblicos), que prenuncia o desfecho da viagem do navio Pequod. Sem contar o narrador-testemunha, Ismael, também uma personagem bíblica, que narra à obra inteira, na primeira pessoa. E o narrador também se dirige ao leitor de forma direta, criando uma identificação entre ele e o leitor-; Ismael é onisciente de tudo que se passa a bordo e do que acontece e acontecerá; e de como terminará a viagem e qual será o destino do Capitão Ahab e da sua tripulação, da qual Ismael também faz parte.

Vale a pena ressaltar também a mistura dos gêneros na obra, pois em muitos momentos os capítulos de Moby Dick se iniciam com notações teatrais, dessa forma a obra faz uma miscelânea poética dos gêneros narrativo (épico), dramático e também lírico (nas cantigas dos marinheiros).
Para Carpeaux, enfim, Moby Dick é uma:

epopeia dos esforços inúteis da humanidade contra as forças da Natureza talvez a primeira obra de literatura universal em que no centro dos acontecimentos não está colocado o homem, mas a realidade objetiva das forças extra-humanas do mar, do Destino como peso material. Contra esse inimigo só vale a atitude cervantina. (Ibid., p. 1897).

A obra é, portanto, “um símbolo da escravização do homem pelo destino: expressão simbólica do dogma puritano da predestinação (...)”. (Ibid., p. 1897).”.



  
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MELVILLE, Herman. Moby Dick. Tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos. São Paulo: Nova Cultural, 2002.

CARPEAUX, Otto Maria. História da literatura ocidental, volume III. São Paulo: Leya, 2011. p. 1895-1897. 

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