quinta-feira, 30 de outubro de 2014

TABU: O PASSADO E O PRESENTE: (rememoração fantasiosa).

TABU: O PASSADO E O PRESENTE

(rememoração fantasiosa)

Tabu, filme de Miguel Gomes, Portugal, 2012.

(crítica por Rafael Vespasiano).


"O cineasta português Miguel Gomes realiza uma das obras-primas do século atual. Tabu, fotografado em preto-e-branco, por vários motivos, eis alguns: ressaltar as emoções e expressividade das personagens; realçar o valor da rememoração que permeia todo o enredo do filme, etc.

Gomes afirma que a escolha do título é uma homenagem ao cineasta alemão, do início do século XX, F. W. Murnau, que filmou uma película com o mesmo título.  No filme de Murnau, na sua fase americana, o “tabu” é o relacionamento de um homem branco com uma índia.

Outra homenagem de Miguel Gomes ao diretor alemão é o nome da personagem principal do filme daquele, a qual se chama Aurora. Outro nome de filme de Murnau, na sua fase americana. No filme deste, uma femme fatale arrasa a vida de um homem e seu estável casamento.

Todas essas influências são transpostas para Tabu, do português Miguel Gomes, de maneira funcional, na estética, de acordo com o enredo proposto para o filme, não são meras referências gratuitas, de fato, Miguel Gomes soube beber das tradições cinematográficas de Murnau, para realizar um filme ímpar.

O filme é marcado por um narrador (a voz é do próprio diretor), que norteia o vai-e-vem entre passado e presente, nas rememorações, da segunda parte; pois, o filme é dividido em duas partes: a primeira, Paraíso Perdido e, a segunda, Paraíso; a primeira se passa no presente da narração fílmica. Com a personagem Aurora já bastante idosa, doente e saudosista, e suas saudades e memórias são sempre interpretadas como “loucuras da idade avançada”, porém, são metáforas fantasiosas sobre o seu passado, que será desvelado, na segunda parte.

O filme é lento, contemplativo, melancólico, contudo essas características não prejudicam o andamento da narrativa, num roteiro enxuto e reflexivo. O nome da personagem principal, Aurora, é bastante sintomático, pois o filme vai do presente para o passado (por meio da memória), a Aurora, - no “presente”, no “Paraíso Perdido”, na primeira parte da história, que se passa em Portugal -, é uma personagem merencória e o tom do enredo é de melancolia, e, na verdade, “o presente” é crepuscular e, não uma “aurora”. Uma “aurora” que é “crepuscular”? Paradoxal?! Mas uma metáfora belíssima. Para comprovar isso, tem que se assistir ao filme.

Ao voltar ao passado, na segunda parte, “Paraíso”, que se passa no continente africano, Moçambique, colônia portuguesa, que lutava naqueles idos pela independência da metrópole (neocolonialismo).  Vemos Aurora vivendo feliz, no “paraíso”, com o marido, até o surgimento de um aventureiro.

Nessa rememoração, nesse grande flashback, há ausência de diálogos, tal quais os filmes silenciosos do início do século XX. O narrador é quem pontua os fatos e os sentimentos em off. Os atores têm que demonstrar as habilidades, as quais os artistas de filmes mudos tinham que mostrar os seus sentimentos e a sua expressividade, por meio dos gestos e do corporal das suas personagens, na Era do Cinema Silencioso. Aqui a maior homenagem aos filmes de Murnau, no sentido cinematográfico do filme de Miguel Gomes. Os atores do filme Tabu, 2012, fazem isso primorosamente bem, eles dialogam, mas os sons das falas não chegam ao espectador. Criando suspense e curiosidade neste. E um efeito estético belíssimo, baseado na sugestão e nas notações narrativas dadas pelo narrador.

Destaque, por fim, na verdade, ao prólogo do filme, uma narrativa fantástica e fantasiosa, que é marcada por um crocodilo, um caçador e uma mulher morta. Esse prólogo é fundamental para entender as fantasias criadas por Aurora na primeira parte do filme e que se explicam na segunda parte, quando da rememoração explanadora desta parte, que é o passado definindo o presente de Aurora.


Excelente filme! Recomendadíssimo."

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P.s.: Murnau dirigiu Nosferatu, até hoje um dos clássicos do horror, o primeiro filme do Drácula, nos cinemas; com atuação hipnótica de Max Schreck, como o Conde Orlok, pois Murnau não tinha os direitos autorais da família de Bram Stocker, para o Conde Drácula, por isso improvisou. 
E fez um dos melhores filmes do, "Drácula", em todos os tempos, não só dentro do Expressionismo Alemão.


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