(“DESCRIÇÃO DA ILHA DE ITAPARICA”, 1769, EUSTÁQUIDOS, 1769, MANUEL DE SANTA MARIA
ITAPARICA):
(“BARROCO VERSUS
NEOCLASSICISMO=NATIVISMO”):
(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO):
““Descrição da Ilha de Itaparica” é um poema,
de 1769, escrito por Manuel de Santa Maria Itaparica, constante do livro Eustáquidos, obra, no geral de caráter tragicômico
e epopeia sacra, também de 1769.
Poema em strictu sensu cronologicamente,
barroco, porém de transição ao nativismo de O
Uraguai e Caramuru, respectivamente,
de Basílio da Gama e de Santa Rita Durão -, (ambos, do final do século XVIII -,
os dois são do Neoclassicismo propriamente dito, contudo, ambos, já transitando
para um pré-romantismo, e, de qualidade estética superior. Realizando epopeias nativistas,
que tendem já ao Nacionalismo ufanista do Romantismo Brasileiro, com temática
indianista e de exaltação das belezas naturais e feitos heroicos do povo
ancestral brasileiro) -, Itaparica, voltemos a ele e a seu poema, tematicamente
neoclássico:
III
Musa que no florido de meus anos
Teu furor tantas vezes me inspiraste
E na idade em que vêm os desenganos
Também sempre fiel me acompanhaste
Tu, que influxos repartes soberanos
Desse monte Hélicon, que já pisaste,
Agora me concede o que te peço,
Para seguir seguro o que começo.
Neste canto III, transita ente o barroco e o
neoclássico, versos 1-3; vai ao neoclássico no verso 6; e pede, inspiração à
Musa, característica essencialmente clássica e não barroca.
O livro de Manuel de Santa Maria Itaparica é,
no geral, barroco, mas o poema “Descrição da Ilha de Itaparica” é uma poesia à
parte de toda a obra de Itaparica. Destacável, facilmente, de Eustáquidos, se realiza como um poema heroico
em sessenta e cinco cantos, de oitavas, esquema de rimas alternadas ABABABCC,
com final de rimas emparelhadas; com versos decassílabos.
Que contrário às inovações futuras de Gama e Santa
Rita Durão, é, de certa forma, nativista. “Descrição da Ilha de Itaparica”,
longe dos pré-românticos O Uraguai e Caramuru, como já afirmado e, mais
distante ainda dos melhores exemplos de poesia nativista e romance nacionalista
do Romantismo Brasileiro do século XIX -, possui um tom cristão e pagão, ainda
devedor do Barroco, em crise de dualidade dicotômica entre cristianismo
Medieval e Paganismo da Antiguidade Clássica; um poema repleto de descrições
detalhadas, antipoéticas, como o próprio título da obra sugere, com raros
momentos de lirismo. Porém, estilisticamente muito melhor que o mero descrever
de vários poemas parnasianos futuros dos poetas brasileiros do fim do século
XIX:
LI
Os limões doces muito apetecidos
Estão Virgíneas tetas imitando,
E quando se vêem crespos e crescidos,
Vão as mãos curiosas incitando:
Em árvores copadas, que estendidos
Os galhos têm, e as ramas arrastando,
Se produzem as cidras amarelas,
Sendo tão presumidas como belas.
LII
A laranjeira tem no fruto louro
A imitação dos pomos de Atalanta,
E pela cor, que em si conserva de ouro,
Por
isso estimação merece tanta:
Abre a romã da casca o seu tesouro,
Que do rubi a cor flamante espanta,
E quanto mais os bagos vai fendendo,
Tanto vai mais formosa parecendo.
LIII
Os melões excelentes e olorosos
Fazem dos próprios ramos galaria.
Também estende os seus muito viçosos
A pevidosa e doce melancia:
Os figos de cor roxa graciosos
Poucos se logram, salvo se à porfia
Se defendem de que com os biquinhos
Os vão picando os leves passarinhos.
LIV
No ananás se vê como formada
Uma coroa de espinhos graciosa,
A superfície tendo matizada
Da cor, que Citeréia deu à rosa:
E sustentando a c'roa levantada
Junto co'a vestidura decorosa,
Está mostrando tanta gravidade,
Que as frutas lhe tributam Majestade.
O tema da caçada à baleia descrito do canto XVI
ao XL, além de ser uma perda de tempo poética, hoje é totalmente politicamente
incorreta, se existe isso em Literatura?!...; mas, se o Japão continua no século
XXI, em uma caça predatória tão animalesca, o texto tem sua atualidade
justamente aí...:
XVII
Monstro do mar, Gigante do profundo,
Uma torre nas ondas soçobrada,
Que parece em todo o âmbito rotundo
Jamais besta tão grande foi criada:
Os mares despedaça furibundo
Coa barbatana às vezes levantada,
Cujos membros tetérrimos e broncos
Fazem a Tétis dar gemidos roncos.
XVIII
Baleia vulgarmente lhe chamamos,
Que como só a esta Ilha se sujeita,
Por isso de direito a não deixamos,
Por ser em tudo a descrição perfeita;
E para que bem claro percebamos
O como a pescaria dela é feita,
Quero dar com estudo não ocioso
Esta breve notícia ao curioso.
O poema possui tons bucólicos, mitológicos, como
se vê nos cantos: VII; VIII; IX, quanto aos temas do bucolismo conferir cantos:
XLV; XLVI; XLVII; XLVIII; XLIX; LIII; LVI-LIX.
Pode se fazer um gancho com o romance Moby Dick
de Melville, porém o livro do escritor inglês é superior literariamente, mas
muito mais preconceituoso contra as baleias... Itaparica descreve muito as
frutas e legumes e árvores, mas ‘esquece’ de falar sobre a fauna da ilha, um
ponto negativo para sua obra já falha. Talvez o poeta pressinta sua
mediocridade literária nos cantos de despedida LXIV e LXV:”
LXIV
Também outra se vê, que é dedicada
À Senhora da penha milagrosa,
A qual airosamente situada
Está numa planície especiosa.
Uma também de São José chamada
Há nesta Ilha, por certo gloriosa,
Junta com outra de João, que sendo
Duas, se vai de todo engrandecendo.
LXV
Até aqui, Musa; não me é permitido
Que passe mais avante a veloz pena,
A minha Pátria tenho definido
Com esta descrição breve e pequena;
E se o tê-la tão pouco engrandecido
Não me louva, mas antes me condena,
Não usei termos de Poeta esperto,
Fui historiador em tudo certo. “”
Esse poema, na parte que fala das baleias, pode e deve ser utilizado como material de conscientização ecológica em aulas de literatura trançada com sustentabilidade no Novo ensino Médio.
ResponderExcluirAdorei. Obrigada.
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