A
CASA DA PAIXÃO - NÉLIDA PIÑON:
“(A
VOZ FEMININA NA LITERATURA BRASILEIRA COMEÇA A SE FAZER PERCEBER: A DESCOBERTA
DA SEXUALIDADE POR UMA JOVEM REPRIMIDA).”
(RESENHA
POR RAFAEL VESPASIANO).
“Nélida Piñon, escritora brasileira
contemporânea”. Escreveu a novela, A casa
da paixão, publicada em 1972, uma obra que faz uma sondagem psicológica da
personagem Marta, seus pensamentos, que resultam em determinadas ações.
O
seu pai nutre um amor incestuoso por ela (que é órfã de mãe, desde criança),
mas, que não chegam as vias de fato, não se concretiza. Por falta de uma
presença feminina em sua vida, a única, é a da sua ama, Antônia, com quem Marta
tem relações de lesbianismo, esta não tem orientação sexual, então, de certa
forma, desenvolve um comportamento estranho: o de se masturbar ao ar livre,
durante o dia, tendo o sol como se fosse um “pênis”, objeto fálico, mas ao
mesmo tempo, como elemento da natureza, o sol também é o próprio Deus, com o
poder de Criação e de Fecundação.
O
pai desesperado devido a esse fato e também devido ao fato da filha “brincar”
com os sentimentos incestuosos dele por ela, num verdadeiro jogo de
gato-e-rato, resolve arranjar um noivo para ela, Jerônimo, os dois no começo se
estranham, mas Marta acaba se entregando e perdendo a virgindade para Jerônimo,
numa das passagens mais bonitas do livro, senão a mais bonita, uma cena de
sexo, erótica, mas sem cair no pornográfico ou obsceno (o livro todo é marcado
pelo erotismo, mas sem apelações).
O
final fica em aberto, mas dá a entender, que Marta e Jerônimo se casam, com o
consentimento do pai daquela e o casal constitui família. Ou seja, num relacionamento que tinha tudo
pra dar errado, Marta e Jerônimo acabam se apaixonando um pelo outro e se amando
mutuamente.
O
livro analisa a psiquê feminina, tentando desvendar os mistérios da alma
feminina (da personagem Marta, no caso), dando voz às personagens femininas, já
que no século XXI, é que estas começaram a se expressar, por meio de mulheres
escritoras, já que até o começo do século XX, era o homem escritor
(principalmente Machado de Assis), que
tentava entendê-las. Já com Nélida Piñon temos uma escritora dando voz às
mulheres, por meio de suas personagens, além de Rachel de Queiroz e Clarice Lispector, que fizeram o mesmo, para
ficar só com essas e só no âmbito da Literatura Brasileira.
Marta
usa e manipula o pai e o Jerônimo, fazendo o que quer na casa onde moram.
Marta, realmente, domina todo o livro. O livro é todo poético, lírico,
metafórico e simbólico - por exemplo, “a casa da paixão” pode ser entendida
como a “casa” onde se desenvolve a trama, como também pode ser interpretada
como a “vagina” de Marta, em termos de poder de fecundação/criação.
Ou
seja, o livro tem múltiplas leituras e interpretações. “A Casa da Paixão”, enfim, é uma curta novela sobre a alma feminina
e os seus anseios, desejos, vontades e sentimentos mais profundos, e ainda tem
um cunho religioso que é o seguinte: o poder da criação representado pelo
elemento da natureza chamado “sol”, que, para Marta era uma espécie de “pênis”
em suas masturbações, então, era como se o próprio Deus, em forma de “sol”,
penetrasse o corpo de Marta, fecundando-o, originando um novo ser (poder da
criação), e isso acontece realmente, e não mais apenas simbolicamente, quando
Marta e Jerônimo transam, com aquela perdendo a virgindade e sendo fecundada
por Jerônimo.
O
Poder de Eterna Criação e Renovação talvez seja o tema principal do livro, talvez,
pois, como já foi dito, a novela tem múltiplas leituras, a maioria delas muito
pessoais. O que demonstra o poder simbólico da obra de Nélida Piñon e seu poder
de sugestão, o que constitui A casa da
paixão numa “obra aberta” (Umberto
Eco), que propõe uma reflexão sobre as relações familiares, sentimentais e
amorosas e sobre a sexualidade feminina. Daí o pioneirismo de Nélida Piñon é tratar do tem nos anos
1970, em plena Ditadura Militar no Brasil. A novela daquela autora é uma
pequena obra-prima.”
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