quarta-feira, 19 de novembro de 2014

A CASA DA PAIXÃO - NÉLIDA PIÑON: “(A VOZ FEMININA NA LITERATURA BRASILEIRA COMEÇA A SE FAZER PERCEBER: A DESCOBERTA DA SEXUALIDADE POR UMA JOVEM REPRIMIDA).”.

A CASA DA PAIXÃO - NÉLIDA PIÑON:

“(A VOZ FEMININA NA LITERATURA BRASILEIRA COMEÇA A SE FAZER PERCEBER: A DESCOBERTA DA SEXUALIDADE POR UMA JOVEM REPRIMIDA).”

(RESENHA POR RAFAEL VESPASIANO).

Nélida Piñon, escritora brasileira contemporânea”. Escreveu a novela, A casa da paixão, publicada em 1972, uma obra que faz uma sondagem psicológica da personagem Marta, seus pensamentos, que resultam em determinadas ações.

O seu pai nutre um amor incestuoso por ela (que é órfã de mãe, desde criança), mas, que não chegam as vias de fato, não se concretiza. Por falta de uma presença feminina em sua vida, a única, é a da sua ama, Antônia, com quem Marta tem relações de lesbianismo, esta não tem orientação sexual, então, de certa forma, desenvolve um comportamento estranho: o de se masturbar ao ar livre, durante o dia, tendo o sol como se fosse um “pênis”, objeto fálico, mas ao mesmo tempo, como elemento da natureza, o sol também é o próprio Deus, com o poder de Criação e de Fecundação.

O pai desesperado devido a esse fato e também devido ao fato da filha “brincar” com os sentimentos incestuosos dele por ela, num verdadeiro jogo de gato-e-rato, resolve arranjar um noivo para ela, Jerônimo, os dois no começo se estranham, mas Marta acaba se entregando e perdendo a virgindade para Jerônimo, numa das passagens mais bonitas do livro, senão a mais bonita, uma cena de sexo, erótica, mas sem cair no pornográfico ou obsceno (o livro todo é marcado pelo erotismo, mas sem apelações).

O final fica em aberto, mas dá a entender, que Marta e Jerônimo se casam, com o consentimento do pai daquela e o casal constitui família.  Ou seja, num relacionamento que tinha tudo pra dar errado, Marta e Jerônimo acabam se apaixonando um pelo outro e se amando mutuamente.

O livro analisa a psiquê feminina, tentando desvendar os mistérios da alma feminina (da personagem Marta, no caso), dando voz às personagens femininas, já que no século XXI, é que estas começaram a se expressar, por meio de mulheres escritoras, já que até o começo do século XX, era o homem escritor (principalmente Machado de Assis), que tentava entendê-las. Já com Nélida Piñon temos uma escritora dando voz às mulheres, por meio de suas personagens, além de Rachel de Queiroz e Clarice Lispector, que fizeram o mesmo, para ficar só com essas e só no âmbito da Literatura Brasileira.

Marta usa e manipula o pai e o Jerônimo, fazendo o que quer na casa onde moram. Marta, realmente, domina todo o livro. O livro é todo poético, lírico, metafórico e simbólico - por exemplo, “a casa da paixão” pode ser entendida como a “casa” onde se desenvolve a trama, como também pode ser interpretada como a “vagina” de Marta, em termos de poder de fecundação/criação.

Ou seja, o livro tem múltiplas leituras e interpretações. “A Casa da Paixão”, enfim, é uma curta novela sobre a alma feminina e os seus anseios, desejos, vontades e sentimentos mais profundos, e ainda tem um cunho religioso que é o seguinte: o poder da criação representado pelo elemento da natureza chamado “sol”, que, para Marta era uma espécie de “pênis” em suas masturbações, então, era como se o próprio Deus, em forma de “sol”, penetrasse o corpo de Marta, fecundando-o, originando um novo ser (poder da criação), e isso acontece realmente, e não mais apenas simbolicamente, quando Marta e Jerônimo transam, com aquela perdendo a virgindade e sendo fecundada por Jerônimo.


O Poder de Eterna Criação e Renovação talvez seja o tema principal do livro, talvez, pois, como já foi dito, a novela tem múltiplas leituras, a maioria delas muito pessoais. O que demonstra o poder simbólico da obra de Nélida Piñon e seu poder de sugestão, o que constitui A casa da paixão numa “obra aberta” (Umberto Eco), que propõe uma reflexão sobre as relações familiares, sentimentais e amorosas e sobre a sexualidade feminina. Daí o pioneirismo de Nélida Piñon é tratar do tem nos anos 1970, em plena Ditadura Militar no Brasil. A novela daquela autora é uma pequena obra-prima.”

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