CANAÃ,
de Graça Aranha:
“(Um embate de ideias, sem
violência física: diferente de fatos recentes, não?)”:
(Resenha por Rafael Vespasiano).
“Livro
publicado em 1901, pelo escritor pré-modernista Graça Aranha. Canaã é um
romance-ensaio, já que o aspecto ensaístico sobrepuja o fictício. Primeiro
livro de ficção brasileiro a tratar de temas socialistas, que estavam ganhando
força no início do século XX. Mas sem deixar o academicismo de lado, apesar do
apoio que Graça daria aos modernistas do país na Semana de Arte Moderna de
1922.
Canaã trata
da imigração germânica no estado do Espírito Santo, nas figuras dos imigrantes
alemães, Milkau e Lentz, que buscam a terra de “Canaã” (paraíso terrestre
prometido por Deus). O Simbolismo está no tema mesmo da obra, a alegoria do
paraíso biblíco prometido ao homem, a terra do leite e do mel: “Canaã”.
Milkau
é liberal, sonhador, socialista, ex-crítico literário num jornal de Berlim,
voltado para a arte, para a natureza, amante da paz, da comunhão fraternal
entre os homens. Milkau representa o apego místico ao solo tropical (ufanismo).
Milkau é um ser frustrado com os fatos que se sucedem ao seu redor (encontra a
mesma monotonia do seu país natal, do qual fugira, saindo em busca da terra
prometida, o país da abundância e da liberdade, “Canaã”).
Já
Lentz é um aristocrata, prussiano, prega a força, a guerra. Lentz é um europeu
empedernido, nietzschiano, defensor de teorias de Darwin, cheio de preconceitos
etnocêntricos (povo europeu representa o centro do mundo/ “a civilização não se
fará jamais nas raças inferiores”/ a etnia branca, europeia, germânica, ariana
“pura” é superior, para Lentz, à “raça” tropical, brasileira, miscigenada
(branca/portuguesa, negra/africana e indígena/brasileira)).
Forma-se,
assim, uma dicotomia entre Milkau e Lentz, que é refletida na colônia germânica
de Cachoeiro e adjacências: os colonos x nativos brasileiros, estes cindidos
entre si, há aqueles aderentes aos imigrantes, e outros contra os imigrantes,
xenófobos. E é estabelecido um par romântico entre Milkau e Maria, um par
sentimental em guerra contra tudo e contra todos.
Com
esses fatos, Graça Aranha monta sua tese, um romance-tese, que lembra os
típicos romances naturalistas de Zola. Só que em vez de conceito de raça
superior x raça inferior, a tese de Aranha em “Canaã” é da comunhão/fraternidade/paz/união das etnias,
miscigenação para o bem da Humanidade.
Contudo,
Aranha desenvolve sua tese de forma confusa, às vezes incoerente com suas
próprias ideias, certa contradição devido aos diálogos entre os protagonistas
de ideiais antagônicos: Milkau e Lentz.
Milkau
e Maria evadem-se ao caminhar para a morte como se no rumo da terra da
promissão, a “Canaã” sonhada, entrevista em Cachoeiro e arredores, dissipa-se,
e em seu lugar instala-se o “Nada, a
Morte”.
A
paisagem idílica que os colonos elegeram dilui-se em favor da certeza niilista de não haver “Canaã” em vida
(felicidade nesta), só na morte, na transcendência espiritual, típica do
Simbolismo.
Tem-se,
portanto, uma tese paradoxal, o livro todo é “otimista”, tom esperançoso
prevalecendo, e, tem-se como conclusão a felicidade só na morte (neoromantismo
também?!).
O
desfecho mostra uma “Canaã” pragmática, cínica, o reino dos pessimistas,
agnósticos, ao contrário do que Aranha defendeu no romance o tempo todo, “Canaã”
como a terra prometida, “Canaã” como sendo
a terra dos humilhados, ofendidos, inocentes (Maria) e, visionários ou
idealistas (Milkau). Mas, a tese não se confirma. Graça Aranha falha, portanto,
na sua defesa.
Canaã
é um romance de transição, oscilando entre o naturalismo, neoromantismo,
simbolismo e correntes modernistas embrionárias, tendo de permeio notas
deterministas típicas da escola naturalista. Porém, já faz parte de uma zona
intervalar que estava a preparar a arrancada revolucionária dos modernistas vindouros:
o Pré-Modernismo.”
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